Turma Joc/133 Pessoas foram presas em manifestações desde 2013, aponta Polícia Militar

Fonte: Wikiversidade


Desde junho de 2013, manifestações de rua têm ganhado força novamente em São Paulo. Após atos reivindicando que a tarifa de transporte público voltasse a ser de R$ 3,00, que foram reflexo de um anúncio de aumento de 20 centavos no preço da passagem.O primeiro ato, organizado pelo MPL (Movimento Passe Livre), contou com somente 2 mil pessoas, número que rapidamente atingiu 1 milhão em atos posteriores.

Uma das características que todas as manifestações ocorridas têm em comum desde então, independentemente do que reivindicam, é a repressão policial. O uso de porrete, balas de borracha, gás lacrimogêneo e outros instrumentos que beiram a tortura. Por essas práticas e outras, também de cunho violento, a capital foi condenada, ainda em outubro deste ano, pela 10ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo. Com a sentença, o Estado deve apresentar um plano de atuação que proíba o uso de armas de fogo, bala de borracha e outros desses instrumentos. De acordo com informações obtidas através da Lei de Acesso à Informação, de 2011, que prevê a divulgação de informações de interesse público, cerca de 133 pessoas foram detidas nas manifestações realizadas na capital nos últimos três anos; o período analisado foi entre 1 de outubro de 2013 e 29 de setembro de 2016, o que exclui os primeiros e maiores atos de 2013, que começaram a ser organizados em junho. Os dados foram enviados pela Polícia Militar de São Paulo, que também informou que, desses 133 presos, “28 deles foram adolescentes indiciados e seis foram apreendidos”. Quando solicitadas maiores informações sobre os detidos, como idade, sexo e causa da detenção, a resposta do órgão foi que “estas informações estão contidas nos referidos Boletins de Ocorrência”. Levando em conta que os boletins são feitos de forma manual, a PM explicou: “não havendo sítio eletrônico ou mesmo um sistema específico que possa extrair as informações contidas no mesmo de forma célere e desburocratizada, o que para tanto demandaria alocação de efetivo específico para efetuar a sua pesquisa, o que causaria excessiva onerosidade aos serviços de essenciais de segurança, uma vez que seria necessário retirar policiais militares do policiamento nas ruas, ou seja da atividade fim, para a elaboração da pesquisa na forma requerida, o que poderia refletir na sociedade como um todo, uma vez que diminui-se o número de policiais militares, bem como de viaturas nas ruas para a execução de pesquisas específicas que não são constantes dos arquivos, o que poderia ocasionar o aumento da criminalidade, haja vista os limitados recursos disponíveis à Administração Pública”.

Contrariando os dados enviados pelo órgão, informações da Polícia Civil de São Paulo mostram que antes de uma das manifestações contrárias ao governo do presidente Michel Temer, ocorrida no dia 9 de setembro, foram detidas 26 pessoas - entre elas, oito menores. Outro ato, realizados por estudantes no dia 5 de setembro, teve mais de 18 jovens menores de idade detidos. Pesquisas e dados obtidos por outros portais e outros órgãos municipais de São Paulo apontam que o número de detidos supera os 133 alegados pela Polícia Militar. Questionada sobre quais dos detidos ainda cumprem pena, o órgão disse: “a Polícia Militar não detém tal informação, sugerimos a vossa senhoria que consulte ao Poder Judiciário, pois não é competência da nossa Instituição”. Foram mais de 50 manifestações ocorridas neste período que a pesquisa da Lei de Acesso à Informação abordou. Seguindo a lógica de que em cada manifestação uma média de 20 pessoas são detidas e feridas pelo por conta da violência policial, esse número supera o apontado pela pesquisa.

O objetivo da Lei de Acesso à Informação é exatamente que esses dados, que são importantes para pesquisas sobre a Segurança Pública de São Paulo, a falta de liberdade de expressão e de livre manifestação dos cidadãos e sobre o uso exacerbado da força policial, sejam divulgados e possam contribuir para a construção de uma sociedade mais transparente. A experiência que tivemos com a obtenção dessas informações, entretanto, não indica que o cumprimento da Lei está de acordo com seu objetivo inicial.


Processo de Levantamento de Dados


No dia 13 de setembro foi feita a solicitação do número de detidos pela Polícia Militar nas manifestações populares ocorridas em São Paulo nos últimos três anos e quais deles cumprem pena, pedindo para o órgão detalhar idade e sexo dos detidos e motivo da detenção. Em 10 de outubro a entidade Polícia Militar do Estado de São Paulo respondeu a solicitação de acesso a documentos, dados e informações, gerando o número de protocolo 558201613235, data 13/09/2016, atendendo as informações solicitadas, porém de maneira incompleta. A entidade apenas enviou os números solicitados e declarou que:


“1. Pessoas Presas: 133

1.1. Adolescentes Sindicados: 28

1.2. Adolescentes Apreendidos: 06

1.3. Procurados / Recapturados: 08


Esclarecemos que não há compilação dos demais dados solicitados como idade, sexo e motivo da detenção uma vez que estas informações estão contidas nos referidos Boletins de Ocorrência. Ressaltamos que o Boletim da Polícia Militar ainda é feito de forma manual, não havendo sítio eletrônico ou mesmo um sistema específico que possa extrair as informações contidas no mesmo de forma célere e desburocratizada, o que para tanto demandaria alocação de efetivo específico para efetuar a sua pesquisa, o que causaria excessiva onerosidade aos serviços de essenciais de segurança, uma vez que seria necessário retirar policiais militares do policiamento nas ruas, ou seja da atividade fim, para a elaboração da pesquisa na forma requerida, o que poderia refletir na sociedade como um todo, uma vez que diminui-se o número de policiais militares, bem como de viaturas nas ruas para a execução de pesquisas específicas que não são constantes dos arquivos, o que poderia ocasionar o aumento da criminalidade, haja vista os limitados recursos disponíveis à Administração Pública. No entanto é dever de todo órgão público facultar e facilitar o acesso aos seus arquivos, pois a Lei assegura à fonte primária, onde vossa senhoria poderá obter os dados brutos e a partir daí, realizar sua pesquisa e análise dos dados na forma que se quer. Portanto, não há recusa de acesso à informação. Como os boletins estão arquivados nas respectivas Companhias Territoriais, existindo 100 (cem) Companhias Operacionais distribuídas por toda Capital do Estado, sugerimos, caso seja do interesse de vossa senhoria, para que possa efetivar sua pesquisa para matéria jornalística, que envie um Ofício para o Comando de Policiamento da Capital, sito à Rua Ribeiro de Lima, nº 140 – Bom Retiro – Telefone (11) 3327-7368, elencando as Companhias PM que se deseja visitar para efetuar a pesquisa no respectivo arquivo para verificação dos Boletins de Ocorrência lavrados pela Polícia Militar do Estado de São Paulo referente a morte decorrente de intervenção policial, bem como solicitando o agendamento para tal visita. Já com relação aos detidos que cumprem pena esclarecemos que a Polícia Militar não detém tal informação, sugerimos a vossa senhoria que consulte ao Poder Judiciário, pois não é competência da nossa Instituição.”


Relação com o Órgão Público

O processo de levantamento da informação, apesar de demorado em obter uma resposta da entidade responsável, ocorreu de maneira simples, pois não houve a negação do órgão público que concedeu a informação, no caso a Polícia Militar do Estado de São Paulo. Contudo o órgão também não se mostrou favorável a fornecer todas as informações detalhadamente, mostrando como o sistema brasileiro ainda possui falhas, a começar pelo fato que não existe um registro eletrônico de todos os boletins de ocorrência já feitos em São Paulo e com isso se torna inviável obter informações detalhadas sobre casos específicos como esse que nós buscamos.


Importância da Lei de Acesso à Informação para a prática jornalística

A verificação de dados públicos concedida pela Lei de Acesso à Informação permite que haja a valorização do jornalismo investigativo. Acreditamos que essa valorização é benéfica de muitas formas, pois não só abre espaço para comprovar denúncias ou questionar fatos, mas contribui para que a sociedade crie uma noção mais ampla dos seus direitos e possa entrar em contato com a transparência, que nada mais é do que parte da democracia. Ela permite a realização de reportagens em todos os âmbitos, cultural, meio ambiente, social e política. É uma forma de fortalecer a democracia e criar pautas de grande importância. Um ponto a ser observado, é que existem duas formas de transparência, a passiva e a ativa, como aponta Bibiana Lopes em seu Trabalho de Conclusão de Curso pela PUC-RS em 2014. A ativa seria aquela que parte do próprio governo, com ação de expor dados em sites e ambientes públicos. No caso do nosso grupo, ao visitar o site da SSP, de fato, encontramos diversos dados, porém nenhum que correspondesse a nossa pesquisa. Foi necessário, então, utilizar a transparência passiva, solicitando a informação para o órgão público, que por sua vez, nos enviou uma resposta incompleta, alegando muito trabalho para a aquisição de detalhes dos Boletins de Ocorrência. Portanto, o benefício da Lei de Acesso à Informação acaba quando as falhas de sistema do Governo Brasileiro são expostas e acabam barrando o processo. De que adiantaria ter o acesso se ele não está facilitado? É preciso que haja uma modernização nos registros de dados e documentos públicos. Para nós, o jornalismo carrega a obrigação de apontar as falhas, também, da Lei de Acesso à informação, afinal, elas representam um perigo para a democracia. Se uma informação é omitida ou fornecida de forma incorreta, isso deve ser dito. A imprensa deve ser reveladora, divulgando os dados que o governo omite, utilizando para isso a transparência passiva. O jornalista deve saber extrair da Lei da Acesso à Informação pautas de interesse público e contribuir para que a sociedade amadureça em relação aos seus direitos. Acreditamos que o melhor uso desses dados é quando o jornalista os expõe na íntegra, assumindo um papel não de editor, mas de expositor. Assim, não sofre interferências de opinião. Apesar de ser algo difícil devido às políticas do veículo, acreditamos que para que sua função fosse completa, este seria o cenário ideal. Assim, o leitor pode também investigar de acordo com seus objetivos, ou seja, o acesso à informação é de todos. Em suma, a LAI é altamente benéfica para o jornalismo e para sociedade, porém, ainda tem grande apoio nos sistemas de registros de dados públicos do governo. Enquanto estes não forem modernizados, o acesso à informação continuará restrito. Cabe a nós, jornalistas, continuar denunciando as falhas nos processos de solicitação.


Por Helena Alfarelos, Gabriella Lima, Júlia Miozzo, Luisa Panza