1.2 Fronteira de Possibilidades de Produção

Fonte: Wikiversidade

Aula 2: a fronteira de possibilidades de produção

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Analisamos agora um primeiro modelo de análise económica. Apesar de ser extremamente simples permite tirar conclusões fáceis e intuitivas que irão permitir uma melhor aprendizagem dos conceitos transmitidos por modelos mais complexos, cujo estudo iniciaremos depois. É necessário compreender bem a teoria bem como a prática desta matéria.


Uma visão radicalmente simplificada[editar | editar código-fonte]

A ciência económica procura analisar a realidade do nosso mundo e a forma como funciona a economia. Contudo numa época em que as variáveis que influenciam o nosso dia-a-dia são tantas torna-se urgente simplificar. Os economistas utilizam por isso a chamada modelização, que consiste na simplificação dos sistemas económicos a modelos simples, claros, práticos que permitam tirar conclusões.

Em microeconomia daremos especial importância ao modelo de procura-oferta, concorrência perfeita e monopólio. "Brincando" com estes modelos e introduzindo algumas variante tiraremos importantes conclusões.


Porém, antes de abordarmos estes modelos mais simples vamos começar com um mais simples: o modelo da fronteira de possibilidades de produção. Este assenta numa extrema simplificação da realidade. Ainda que absurda é-nos útil para nos introduzir e aplicar alguns conceitos económicos que nos serão úteis mais para a frente!

O modelo da fronteira das possibilidades de produção (FPP) representa uma economia muito simples que depende apenas da produção de dois produtos e tendo um único factor de produção. Assim, neste capítulo é necessário ter em consideração que a economia só produz dois produtos, e apenas a quantidade de trabalho deslocado ora para a produção de um ou para outro poderá alterar os resultados.


Para sistematizar os conhecimentos de forma prática vamos utilizar no resto do capítulo o mesmo exemplo. Considere a seguinte situação:

No meio do Atlântico existe uma ilha. A ilha Selvagem encontra-se totalmente isolada do resto do mundo. A população desta ilha tem à sua disposíção: ananases e peixes. Os trabalhadores da ilha dispõe de 60 horas semanais para trabalhar e caçar/colher estes produtos necessários à sua alimentação. Sabe-se ainda que para se apanhar um conjunto de peixes demora-se 1,5 horas e para apanhar um cesto de ananás demora-se 2 horas.

Com base nesta situação é possível traçar a fronteira de possibilidades de produção da economia. Sabemos que se se dedicarem apenas à pesca, produzirão 0 ananáses e 40 peixes. Se só apanharem ananáses produzirão 30 e 0 peixes.

Esta economia representada pelo seguinte gráfico. (Condiderando que o trabalho não é homogéneo)


A curva representa todas as possibilidades de produção que podem ser atingidas com os recursos e tecnologias existentes. Nos eixos estão representados os dois produtos produzidos pela economia e a curva representa todos os pontos de produção possíveis. É o resultado da afectação de recursos (neste caso trabalho). Podemos colocar todos a produzir X ou Y ou ambos. A curva representa por isso os pontos de eficiência de produção: os pontos em que os recursos (trabalho) está a ser utilizado ao máximo.

Pontos interiores (D) à curva são pontos ineficientes, pois existem recursos que poderiam ser utilizados para produzir mais. Ou seja, é possível alocar os recursos de modo a produzir mais Ananás e mais Peixe.

Os pontos eficiente (A e B), todos os que estão sobre a curva, representam os pontos em que qualquer alteração feita levará sempre a perder um bem. Se quiser produzir mais Ananás terei que abdicar de Peixe e vice-versa.

Os pontos exteriores (C) à curva são precisamente os pontos impossíveis, uma vez que não existe nenhuma combinação de recursos possível que me permita produzir nesses pontos!


Porquê uma curva? A fronteira de possibilidades de produção não tem necessariamente definida por curvas. Acontece por vezes ser definida por rectas. Neste curso trabalharemos com rectas pois é mais intuitivo e o seu cálculo é mais fácil. Contudo convém ter noção que as FPP's são geralmente curvas. Este facto deve-se ao facto dos factores de produção não serem homogéneos. Ou seja, se tivermos uma economia que produz batatas e cebolas e só produzir batatas, todos os meus recursos estarão alocados para este bem. Contudo se eu quiser produzir algumas cebolas, vou retirar alguns trabalhadores das batatas e passá-los para as cebolas. Parte-se do príncipio que os trabalhadores escolhidos são os melhores nas cebolas e o piores nas batatas. Isto significa que ao deslocarmos estes trabalhadores temos uma perda pequena na produção de batatas e um grande ganho na de cebolas. Há medida que avançamos na curva a situação inverte-se até que no limite estamos a deslocar trabalhadores muito bons nas batatas para um mercado onde são péssimos: os das cebolas. Trabalhar com FPP recta não tem isto em conta. Em rectas parte-se do princípio que todos os trabalhadores são iguais! É apenas um promenor técnico, mas importante para consolidar conhecimentos!


Daqui para a frente ao trabalharmos com este exemplo teremos uma FPP recta representada por:

As possibilidades de produção de uma economia[editar | editar código-fonte]

Todas as possibilidades de produção de uma economia é representada como a área por baixo da FPP. Claro que os pontos eficientes são os da curva e, como já vimos, os pontos inferiores são pontos de ineficiência e desperdício de recursos.


A Recta das Preferências


Se os pontos de eficiência são todos os da curva, temos por isso n pontos de eficiência. Como decidir qual o melhor? De novo é-nos introduzido a questão da escolha. A escolha vai depender das preferências dos consumidores!

Considerando a economia acima representada, como decidir qual dos pontos A, B ou C escolher? São todos pontos de eficiência! Sabemos que em autarcia (economia fechada) o ponto de produção será igual ao ponto de consumo, e sabemos que o ponto de consumo será influenciado pela recta das preferências. Assim, se soubermos que nesta economia os consumidores valorizam a comida tanto como os computadores, teremos um recta das preferências y=x. Ou seja Ananás = Peixe. A valorização de ambas as unidades é igual. Ao traçar a recta vamos obter um ponto de intersecção com a FPP. Esse ponto corresponde ao escolhido para a produção. É nesse ponto que são produzidos os bens (nas proporções desejadas pelos consumidores, neste caso 1:1) com a máxima eficiência! Se porém se soubesse que a população valoriza o ananás duas vezes mais que os peixes teríamos então uma outra recta das preferências: Ananás = 2 Peixes. Que se traduz y=2x, e que significa que para obter a mesma satisfação por um cesto de ananás, a população teria que consumir dois peixes! A recta das preferências é um dado do enunciado. Consideremos daqui para a frente que na ilha Selvagem, a intersecção da recta com a FPP dá-nos o ponto de produção em economia fechada (PPF) seguinte:


O Custo de Oportunidade na FPP

Uma vez que para definir o ponto de produção em economia fechada temos que fazer uma escolha surge a inevitável ligação ao custo de oportunidade (CO) que analisámos no capítulo anterior. Este vai-nos permitir responder a questões do tipo "Quantos computadores terei que abdicar para produzir mais uma unidade de comida?", e vice-versa.

Vamos por isso analisar o impacto na quantidade produzida do bem B, se variarmos numa unidade a produção do bem A. Este valor que teremos que abdicar de produzir representa o custo de oportunidade na FPP!


Em Rectas:

O cálculo em rectas do CO é bastante simples. Como se trata de uma recta o factor de produção (trabalho) é homogéneo. Como a produtividade marginal é constante, então o custo marginal também o será!

CO A,B = Total máximo de B / Total máximo de A


Esta fórmula indica-nos o custo de produzir mais uma unidade de A em termos de B e calcula-se como o quociente entre a quantidade máxima possível de produzir do bem B, pela quantidade máxima do bem A.

Com base no nosso exemplo inicial vamos calcular os CO da ilha selvagem:

CO a,p = 40/30 = 4/3

Ou seja, o custo de se produzir mais um cesto de ananás será a perda de 2 conjuntos de peixes.

Para calcular o CO p,a, podemos utilizar a mesma forma de cálculo ou, se simplesmente fazer o inverso do CO a,p.

Assim temos que:

CO p,a = 1/Co a,p = 3/4


Em curvas

Nas FPP's curvas o raciocínio é idêntico. Contudo como é uma curva a produtividade marginal é decrescente e o custo de oportunidade vai variar dependendo do ponto em que estamos a produzir! Para tal teremos que utilizar o conceito de derivadas parciais.


CO x,y = |ƏY/ƏX|

Fazendo a derivada no ponto de produção teremos o CO de um bem em termos do outro.


Se contudo a nossa FPP for descontínua (não uma linha mas apenas um conjunto de pontos), devemos calcular o custo de oportunidade com recurso à seguinte fórmula:


CO x,y (quando X=a) = |ΔY/ΔX|

Alterações na Tecnologia de Produção[editar | editar código-fonte]

O gráfico seguinte demonstra o efeito de alterações da tecnologia nas FPP's.

Se temos uma nova tecnologia poderemos produzir o mesmo em menos tempo logo irá existir uma expansão da FPP. A única forma de passar a PRODUZIR em pontos que anteriormente estavam inacessíveis é expandindo a FPP.

A alteração da tecnologia no produto X, permitirá uma expansão da FPP de A para B. Ou seja, passa a ser possível mais unidades de X mas não de Y, pois a sua tecnologia manteve-se inalterada. Se fizermos o contrário (alterarmos a tecnologia de Y) obteremos o mesmo efeito: uma expansão das possibilidades de produção do produto Y e o produto X ficará igual.

Se contudo alterarmos ambas as tecnologias, teremos uma expansão da FPP de A para C, permitindo uma maior produção simultânea de ambos os bens: X e Y.

A Abertura ao Comércio Internacional[editar | editar código-fonte]

Regressando ao nosso exemplo temos neste momento uma economia que produz ananás e peixe. O seu ponto de produção (PPF) é igual ao seu ponto de consumo (PCF) e corresponde a (28,9).


Consideremos agora que, após a construção de uma canoa, foi possível aos habitantes da Ilha Selvagem encontrarem uma outra ilha perdida no Atlântico: a ilha Tórrida. Esta ilha tem as seguintes características:

  • Produz os mesmos bens que a Selvagem (Ananás e Peixe)
  • Dispõe do mesmo tempo de trabalho (60 horas)
  • Demora 6 horas a produzir 1 Peixe e 3 horas a produzir 1 Ananás.

A sua FPP é representada por:

Prende-se a seguinte questão: Saem as duas ilhas beneficiadas se se decidir fazer comércio?

Para responder a tal questão teremos que fazer alguns cálculos.

Considere que o Ponto de Produção da Ilha Selvagem é de (6,8).

Em primeiro lugar devemos calcular os CO da ilha Tórrida da mesma forma que fizemos para a ilha Selvagem. Os resultados encontram-se sintetizados na seguinte tabela:

Ilha Selvagem Ilha Tórrida
CO a,p 4/3 1/2
CO p,a 3/4 2


Com base nos resultados da tabela sabemos que:

  • Vantagens absolutas: a Ilha Selvagem detém as vantagens absolutas pois produz mais em ambos os produtos.
  • Vantagens comparativas: a Ilha Selvagem tem vantagens comparativas em Peixe e a Tórrida em Ananás. Estas vantagens são determinadas com base na relação entre os Custos de oportunidades do mesmo bem em ambas as ilhas. São estas vantagens que interessam para o comércio internacional pois permite minimizar os custos!


Especialização das Economias:

  • Ilha Selvagem: Vai produzir Só peixe. Exportando o que sobra e importando ananás com o dinheiro das importações.
  • Ilha Tórrida: Vai produzir Só ananás. Exportando o que sobra e importando peixe com o dinheiro das importações.

Consideremos que ambas as ilhas são price-takers (a alteração nas quantidades produzidas não afectam os preços internacionais devido à sua reduzida importância num mercado global). E que a nível global Peixe = Ananás, ou seja os preços são iguais.

Desta forma os padrões de troca serão de 1:1 » 1 peixe por um ananás.


Assim vamos ter as economias a produzir o seguinte:

  • Ilha Selvagem: 40 peixe. 0 ananás.
  • Ilha Tórrida: 20 ananás. 0 peixe.


Trocas:

  • Ilha Selvagem: Exporta 10 peixes e importa 10 ananás.
  • Ilha Tórrida: Exporta 10 ananás e importa 10 peixe.

Note que a balança comercial fica equilibrada pois os preços são iguais. As importações são compensadas pelas exportações em ambas as economias!


Ponto de Consumo em Economia Aberta:

  • Ilha Selvagem: 30 peixes ; 10 ananás.
  • Ilha Tórrida: 10 prixes ; 10 ananás.

Estes pontos de consumo finais são melhores que os iniciais, logo o comércio internacional é positivo pois permite CONSUMIR em pontos anteriormente impossíveis!

O modelo de FPP ajuda-nos a compreender que a especialização ocorre de acordo com as vantagens comparativas (comparação entre os custos de oportunidade), e que os termos de troca são enquadrados entre os custos de oportunidade!

A imagem de baixo mostra as vantagens do comércio internacional. As rectas V1, V2 e V3 representam rectas de iso-valor, ou seja todos os pontos sobre a mesma recta conduz ao mesmo gasto de recursos. Por construção geométrica sabemos que o ponto no qual os recursos serão mais eficientemente utilizados será sobre a FPP. Desta forma encontramos a recta de iso-valor V3, que é tangente à FPP. ´Se produzirmos no ponto C será possível consumir em qualquer ponto para baixo da recta. Ou seja, produzir no ponto C permite consumir algo com os mesmos custos numa zona que anteriormente era inacessível. A área a verde representa por isso os ganhos de comércio: as novas possibilidades de consumo que surgem gastando o mesmo e produzindo no ponto C.

ASSIM CONCLUI-SE O CAPÍTULO 1 PROVANDO QUE A EXISTÊNCIA DE COMÉRCIO INTERNACIONAL É POSITIVO!