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A luta por direitos civis negros nos EUA (O caso, 1955-68)

Fonte: Wikiversidade

A luta por direitos civis dos negros nos EUA foi um movimento que defendia a igualdade das comunidades afro-americanas, que eram discriminadas por leis segregacionistas como as de Jim Crow, na qual o racismo antinegro era legalizado.  O movimento defendia a abolição da segregação e da discriminação racial em todo o território americano.

A escravidão, na maioria das colônias americanas (do Sul), foi o principal sistema econômico utilizados pelos ingleses. Entre 1619 e 1863, milhares de negros escravizados eram trazidos da África pelos colonos, tornando assim, a escravidão a principal base econômica e social do país.

Os escravizados eram submetidos a condições insalubres de trabalho e a torturas, sendo considerados propriedade privada de seus donos. As chicotadas eram uma das principais punições aplicadas aos desobedientes.

A Guerra Civil Americana e o fim da escravidão dos EUA

A Guerra Civil Americana, conflito entre a região norte e a região sul dos EUA ocorrida entre os anos de 1861-1865, fez com que a escravidão fosse abolida no território por conta da vitória da região norte, favorável a abolição da escravidão. A Proclamação de Emancipação foi o documento assinado por Abraham Lincoln que, oficialmente, abolia a escravidão dos Estados Unidos.

Entretanto, mesmo com o fim da escravidão, que torturou e matou milhares de afrodescendentes por 244 anos, os negros ainda não tinham os mesmos direitos civis que os brancos estadunidenses. Mesmo que a Constituição Americana garantisse, os direitos fundamentais a todos os cidadãos desde 1787, a população negra tinha esses direitos negados, devido às legislações estaduais do Sul.

As Leis de Jim Crow, conjunto de leis que institucionalizam a segregação e a discriminação contra pessoas negras, são exemplos de medidas adotadas por diversos estados do sul dos Estados Unidos.  

Com a segregação e a discriminação legalizadas contra este grupo social pela legislação dos estados, os negros não tinham os mesmos direitos à moradia, educação, trabalho e do uso do mesmo transporte público que os brancos. Além disso, não podiam frequentar ou consumir nos mesmos lugares que os brancos. Diante desse cenário, vários grupos de supremacia branca surgiram, como a Ku-Klux-Klan, que promoveu vários linchamentos e assassinatos contra afrodescendentes.

Esse problema social é considerado uma herança da escravidão, que permaneceu durante muitos anos no país. Esse cenário iria mudar posteriormente, com uma onda de protestos contra as políticas de segregação racial e a discriminação contra negros.

O início

O marco inicial deste movimento se deu no Sul, a região mais racista do país, na cidade de Montgomery, Alabama. Em 1 de dezembro de 1955, a costureira negra Rosa Parks (conhecida como “A Mãe dos Direitos Civis”) se recusou a ceder seu lugar para um homem branco, prática obrigatória de acordo com as leis segregacionistas daquele estado. Tal ato desencadeou das lutas pelo fim da segregação racial nos Estados Unidos.  

Eventos Históricos:

  • 1957 - A Dessegregação em Little Rock

Após decisões de Cortes Federais, nove estudantes negros conseguiram o direito de estudar no ginásio central de Little Rock, cidade de Arkansas, a qual era marcada pela segregação nas escolas. Logo no primeiro dia de aula, os estudantes sofreram com insultos e ameaças feitas pelos demais estudantes e pela população branca ali presente, acabando sendo forçados a voltarem para suas casas pela guarda nacional, por ordem do governador, contrariando a decisão judicial. Em resposta, o então presidente Dwight Eisenhower dissolveu a guarda nacional da cidade e enviou tropas de paraquedistas para garantir a entrada e segurança dos alunos negros, cumprindo a decisão das cortes federais.

https://www.welt.de/politik/article1154158/Wie-neun-Schueler-die-Rassentrennung-beendeten.html

  • 1961 – O protesto de Greensboro

Estudantes negros e brancos na cidade de Greensboro, Carolina do Norte, em protesto contra a segregação racial em locais públicos, se sentaram em grupos em lanchonetes, lojas, praças e demais estabelecimentos. Muitos eram presos e soltos, por vezes arrancados violentamente pela polícia. Este evento culminou em outros protestos semelhantes, em outros estados durante o início da década de 60.

  • 1962 – O Caso James Meredith

Em 20 de setembro de 1962, início do ano letivo americano, o estudante James Meredith ganhou, por decisões de cortes federais, o direito de ingressar na universidade do Mississipi, estado mais conservador do país. Na tentativa de entrar no campus, por duas vezes foi impedido por interferência direta do governador, o qual alegava que em seu mandato "nenhuma escola do Mississipi seria integrada". Após nova luta judicial, a Corte Federal instituiu uma multa diária de 10 mil dólares a cada dia que o estudante fosse impedido de entrar na universidade. Meredith conseguiu ingressar na universidade escoltado por agentes federais, em 30 de setembro.

Posteriormente, civis e estudantes brancos iniciaram um grande conflito na universidade e suas vizinhanças, resultando na morte de duas pessoas, 28 agentes federais baleados e mais de 180 civis feridos. No dia seguinte, o presidente John Kennedy enviou tropas do exército para conter os tumultos na cidade e garantir a entrada e permanência de Meredith na universidade.

https://www.latimes.com/world-nation/story/2022-10-01/ole-miss-honors-james-meredith-60-years-after-integration

  • 1963 – A Marcha sobre Washington

Em agosto de 1964, mais de 250 mil manifestantes, negros e brancos, de diversos locais de todo país, se reuniram na capital Washington para um dia de discursos, protestos e cantos em favor da igualdade dos direitos civis para toda nação, destacando-se as figuras de Martin Luther King, Bayard Rustin e Phillip Randolph. Em uma das maiores manifestações pacíficas da história dos Estados Unidos, com intuito de conquistas de direitos como: integração racial, direito à moradia digna, pleno emprego, direito ao voto e educação integrada. A música se tornou um ponto crucial na mobilização e inspiração desses movimentos, dando voz ao movimento de direitos civis. Cantores como Mahalia Jackson e Harry Belafonte, apoiadores do movimento, fizeram com que a música "We shall Overcome" se tornasse um hino não oficial dessa mobilização.

https://historia.nationalgeographic.com.es/a/marcha-sobre-washington-1963-imagenes_11032

  • 1964 – O Verão da Liberdade

Durante o verão de 1964, férias escolares americanas, um grupo de mais de 100 estudantes, negros e brancos, voluntários da luta pelos direitos civis do norte do país, se dirigiram ao sul na busca pelo direito do voto negro e formação de um partido pela liberdade do Mississipi. Três desses manifestantes acabaram sendo assassinados pela Ku Klux Klan, junto com autoridades policiais da Filadélfia. Seus corpos foram encontrados perfurados por tiros, após meses de buscas do FBI, enviados pelo presidente Johnson para assumir as investigações. A indignação da população pelo caso ajudou o presidente Lyndon Johnson na aprovação junto ao Congresso das leis dos direitos civis, em 2 de julho de 1964.

https://www.adorocinema.com/filmes/filme-231710/fotos/detalhe/?cmediafile=21134205

  • 1964 – Prêmio Nobel

No fim de 1964, Martin Luther King recebeu o prêmio Nobel da paz por seus esforços pacíficos na luta pelos direitos civis nos Estados unidos e o fim da segregação racial no país.

https://eddao-padded.blogspot.com/2021/01/martin-luther-king-premio-nobel-de-la.htmar

  • 1965 – Selma (Alabama) e o Direito de Voto

Martin Luther King liderou passeatas e manifestações na cidade de Selma, no Alabama, em prol do direito de cidadãos negros se registrarem como votantes, em oposição ao chefe de polícia da cidade, Jim Clark. Ele e centenas de manifestantes foram presos, ainda assim as manifestações continuaram e acabaram incitando a violência por toda a cidade, resultando na morte de uma manifestante por parte da polícia. Nos dias que se seguiram, choques entre civis brancos locais, policiais a cavalo e manifestantes negros resultaram em tumultos generalizados com mortos e feridos, transmitidos pela televisão para todo o país. As cenas causaram a mesma indignação dos fatos ocorridos no Mississipi, no ano anterior, e permitiram ao Presidente Johnson conseguir aprovar junto ao Congresso a Lei do Direito de Voto, em 6 de agosto de 1965. Esta decisão provocou a famosa lamentação de Lyndon Johnson de que “com essa assinatura acabo de perder os votos do sul na próxima eleição”. Lyndon Johnson acabou desistindo da reeleição em 1968, devido aos protestos generalizados no país por causa da Guerra do Vietnam.

O direito ao voto mudou para sempre a face política do sul dos EUA, fazendo com que, em 1966, o número de negros eleitos para cargos públicos no Mississipi, o mais racista dos estados sulistas, fosse maior do que em qualquer outro estado do país. Em 1965, pouco mais de 100 negros foram eleitos para mandatos públicos nos EUA. Hoje, os agora chamados afro-americanos são mais de 8 000 000, a maioria em estados do sul.

https://www.teachingforchange.org/selma-bottom-up-history

  • 1966-1975 – O Black Power e os Panteras Negras

Em contraponto, com a política de integração através da não-violência de Martin Luther King, surgiu em 1966 um grupo de homens liderados por Stokely Carmichael, o qual pregava a necessidade dos negros de se defenderem dos ataques sofridos pela Ku Klux Klan, no sul do país. A partir de seus discursos os negros sulistas, em número muito maior do que o da organização racista, passaram a enfrentar armados os ataques de grupos racistas da região, fazendo com que a Klan desistisse de aterrorizar os habitantes negros do Sul. Este movimento passou a ser chamado de “Black Power”.

O movimento pelos direitos civis enfrentava a violência através da violência. Os jovens integrantes do Black Power passaram a mostrar orgulho pela sua etnia, ganhando maior identidade cultural, exteriorizando seus sentimentos. Dentre os meios encontrados para reforçar a mobilização, os integrantes deste grupo usavam indumentárias coloridas e cabelos no que chamavam de estilo afro, inspirados na cultura africana.

O sentimento de combater o racismo, a injustiça e a violência com a mesma moeda, cada vez mais crescente, culminou no surgimento da organização conhecida como “Panteras Negras”, um pequeno partido político criado em Oakland, Califórnia, disposto a lutar pela igualdade racial e política “por quaisquer meios”. Os seguidores da ideologia de Malcom X tinham como indumentária padrão, de casacos pretos de couro, boinas, camisas azuis e cabelos afro passou a fazer parte da paisagem política e policial americana junto com sua saudação de punho levantado, até o meio dos anos 70, sempre ligada a métodos agressivos de protestos e retaliação. Todos os seus mais conhecidos líderes, como Huey Newton, Bobby Seale e Angela Davis, acabaram presos devido às ações repressivas do governo do republicano Richard Nixon.