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Análise do filme "Cafundó" - Catherine Navarro

Fonte: Wikiversidade

FICHA TÉCNICA


Título do Filme: Cafundó

Ano: 2005

País: Brasil

Gênero: Documentário/Drama

Duração: 1h42m

Direção: Clóvis Bueno e Paulo Betti

Roteiro: Escrito por Clóvis Bueno, Paulo Betti e Miguel Jorge, baseado na peça teatral homônima de Paulo Betti e na vida de João de Camargo.

Fotografia: Pedro Farkas foi o responsável pela direção de fotografia, ele trouxe uma atmosfera realista e poética, destacando o contraste entre a opressão do cativeiro e a mística espiritual de João de Camargo.

Trilha sonora: A trilha sonora foi composta por Naná Vasconcelos, um renomado percussionista brasileiro. Ela mistura ritmos afro-brasileiros e elementos místicos, o que completa a jornada espiritual do protagonista.

Elenco original:

Lázaro Ramos como João de Camargo

Leona Cavalli como Rosário

Leopoldo Pacheco como Coronel Justino

Leandro Firmino como Antero

Flavio Bauraqui como Inácio

Produção: O filme foi produzido pela Bananeira Filmes, com Paulo Betti, Clóvis Bueno, e Gisela Camara na produção executiva.

Idioma original: Português

Sinopse:

Cafundó narra a história de João de Camargo, um ex-escravo que, após conquistar sua liberdade, enfrenta a dureza da vida pós-abolição no Brasil rural do início do século XX. Ao passar por uma experiência espiritual, João começa a ser visto como uma figura de cura e espiritualidade, fundindo crenças africanas e cristãs em sua prática religiosa. A trama explora o poder da fé e da resistência cultural em um país ainda marcado pela escravidão, enquanto João, interpretado por Lázaro Ramos, se transforma em uma figura controversa, reverenciado por alguns como santo e questionado por outros. O filme aborda as tensões raciais, a busca por identidade e a espiritualidade popular no Brasil.


DINÂMICA DA NARRATIVA


A) Idéia Inicial – História

1- O filme conta uma história. Sobre quem?

R: O filme conta a história de João de Camargo, um ex-escravo que se torna uma figura religiosa no interior paulista, no período pós-abolição.

2- Quais são as personagens principais?

R: As personagens principais são João de Camargo, o protagonista, e figuras como Rosário, sua paixão; Coronel Justino, o fazendeiro que detém o poder local; e Inácio, um dos companheiros de João.

3- Qual delas mereceu a sua atenção?

R: O personagem Inácio foi o que mais me chamou a atenção no filme por seu papel como contraponto na trajetória de João. Inácio é uma figura que compartilha parte da experiência de João como homem negro e ex-escravo, mas, ao mesmo tempo, ele lida com essas adversidades de maneira diferente. Ele representa aqueles que, ao invés de buscar uma saída espiritual, tentam sobreviver e resistir às imposições sociais e raciais de forma mais prática e direta. Isso mostra o contraste entre duas formas de enfrentamento das adversidades no Brasil pós-abolição, destacando as diversas respostas que os negros tinham diante da opressão e do racismo. Inácio não nega a espiritualidade de João, mas também não se entrega a ela da mesma forma, mostrando uma diversidade de reações e trajetórias dentro da mesma comunidade. O que faz dele uma figura complexa e reflete a realidade de muitos que optaram por lutar por seus direitos e reconhecimento de maneira mais direta, em vez de se voltar exclusivamente à fé.

4- Como termina o filme? O que você achou sobre ele e porquê?

R: O filme termina com João se estabelecendo como uma figura espiritual importante, venerado por muitos como santo e curandeiro. Apesar de conquistar esse status entre os seguidores, ele permanece uma figura controversa, enfrentando tanto a admiração quanto a desconfiança de diversos setores da sociedade. O final deixa em aberto o grau de entendimento que as pessoas tinham sobre ele, reforçando as tensões entre fé e preconceito racial.

Achei o final impactante e adequado, pois ele não dá uma resposta definitiva sobre a verdadeira natureza dos poderes de João, permitindo que o espectador reflita sobre o papel da fé popular e da religiosidade afro-brasileira no contexto de uma sociedade que ainda carrega o legado da escravidão. Para mim, o filme faz justiça ao deixar essa ambiguidade, uma vez que João de Camargo foi uma figura real cercada por mistério e crenças divergentes. Esse desfecho reforça o quanto a espiritualidade de origem africana, especialmente nas religiões como a Umbanda e o Candomblé, foi historicamente marginalizada e, ao mesmo tempo, uma forma de resistência para a população negra.


B) Tema de Fundo – Tese

1- Quais são os temas tratados no filme?

R: O filme aborda temas como religiosidade popular, racismo, sincretismo religioso, e o impacto da escravidão nas vidas dos negros após a abolição.

2- Em que cena compreendeu o tema de fundo do filme?

R: A cena em que João tem sua primeira visão, interagindo com santos e entidades africanas, foi a que mais me conectou com o tema de fundo do filme. Para mim, como umbandista, foi um momento de reconhecimento, onde vi a conexão com o sincretismo religioso que é uma característica central da Umbanda. Ver essa representatividade é raro e muito valioso.

3- Qual o problema ou questão que foi tratada mais demoradamente?

R: O problema tratado mais demoradamente foi a questão racial e social enfrentada pelos negros após a abolição, que mesmo livres, continuavam sem muitas oportunidades e em busca de um sentido para suas vidas em uma sociedade que ainda os marginalizava.

4- Os realizadores descreveram bem os protagonistas?

R: Os realizadores descreveram bem os protagonistas, especialmente João de Camargo, que foi retratado de forma complexa e profunda. Ele não é apenas um curandeiro, mas um homem em busca de identidade e significado, lidando com as cicatrizes do passado.


C) Ritmo e Montagem – Edição

1- Qual a cena ou seqüência que mais chamou sua atenção ou lhe impactou? Porquê?

R: A sequência mais impactante para mim foi a do primeiro encontro de João com as entidades espirituais. Essa cena, com sua intensidade visual e espiritual, me fez refletir sobre como a Umbanda valoriza e celebra o contato com os guias e protetores, como os Pretos Velhos. Ver essa representação de espiritualidade africana no cinema nacional me trouxe satisfação, pois sinto que minha religião precisa desse tipo de visibilidade.

2- Houve algo no filme que te aborreceu? Em que parte do filme? Eram cenas de diálogo ou de ação?

R: O que me aborreceu foram algumas cenas mais lentas e repetitivas envolvendo os conflitos entre João e as pessoas do local. Em alguns momentos, senti a narrativa se arrastar, especialmente nas cenas de diálogo que não avançavam a trama.

3- Qual a cena/seqüência que não foi bem compreendida por você? Porquê?

R: Uma cena que consegui entender, mas achei difícil de perceber em alguns momentos, foi a da transição em que João tem uma visão espiritual intensa, rodeado por entidades e figuras religiosas, mesclando elementos africanos e católicos. Embora a sequência transmita a profundidade da conexão de João com suas raízes espirituais, alguns símbolos e imagens foram tão rápidos e sobrepostos que se tornaram difíceis de decifrar. A montagem ágil e os efeitos visuais dificultaram a minha percepção. Apesar de entender a essência da cena, senti que a densidade dos elementos apresentados poderia ter sido explorada de forma mais clara para melhor comunicar a espiritualidade rica e complexa que ele estava experienciando.


D) Mensagem

1- O que é proposto pelo filme é aceitável ou não? Porquê?

R: O que é proposto pelo filme é aceitável, especialmente ao valorizar a espiritualidade afro-brasileira, que, para mim, é fundamental. A forma como João Camargo é retratado como um Preto Velho é poderosa e válida, pois traz uma visibilidade importante para religiões como a Umbanda, que muitas vezes são marginalizadas ou mal compreendida

2- A quem se dirige, em sua opinião, o filme?

R: Na minha opinião, o filme se dirige não apenas a quem estuda a história do Brasil ou a cultura negra, mas também a pessoas que, como eu, se conectam com as tradições religiosas afro-brasileiras. Ele oferece uma narrativa que respeita essas crenças e coloca o sincretismo e a espiritualidade no centro da narrativa, algo raro e muito necessário.


E) Relação com a disciplina de História do Brasil

1- Qual a contribuição do filme para sua compreensão da disciplina e do período estudado?

R:O filme funcionou como uma boa ferramenta para a minha compreensão do período pós-abolição, pois ilustra como os ex-escravos lutaram para estabelecer novos caminhos de sobrevivência em uma sociedade que mantinha preconceitos raciais. A trajetória de João de Camargo exemplifica a resiliência dos afrodescendentes e a forma como as tradições africanas foram reinterpretadas e incorporadas em um contexto onde o catolicismo e a opressão eram predominantes. Essa representação foi essencial para o meu entendimento de como essas comunidades construíram identidades e formas de resistência.

2- Relacione as contribuições desse trabalho para sua formação.

R: Para a minha formação em Ciências Sociais, o filme apresenta uma boa oportunidade para discutir a interseção entre religião, cultura e resistência. A forma como João incorpora elementos das tradições africanas em sua prática espiritual desafia as narrativas dominantes e nos leva a refletir sobre a importância da religiosidade na construção da identidade afro-brasileira. Além disso, o filme me despertou a vontade de estudar como foi a experiência dos negros após a abolição e me motivou a considerar uma pesquisa sobre a diáspora africana, explorando como essas comunidades enfrentaram a marginalização e buscaram ressignificar suas identidades e tradições. Essa perspectiva enriquece meu entendimento sobre as complexidades das relações sociais e históricas que moldam nosso país.