Jornalismo Básico 2: reportagens especiais/Reportagens do JOB/Andressa Isfer e Eliane Rodrigues
A rua minada
Em um espaço de 100 metros localizado no centro velho de São Paulo está a famosa Rua do Ouro. Nomeada oficialmente como Barão de Paranapiacaba, a viela é tida como o melhor lugar para comprar e vender joias de ouro e prata da metrópole. Logo ao virar sua esquina pode-se ver, ao longo dos antigos ladrilhos brancos que compõem o chão, inúmeras joalherias, prédios e fábricas de ambos os lados. É como um estreito corredor formado por paredes de prédios que termina na Praça da Sé, no coração de São Paulo. Homens com cartõezinhos em mãos são os mais comuns neste local: eles te recepcionam oferecendo as melhores condições para comprar alianças, colares, anéis ou outras joias. Poucas senhoras exercem a mesma função, buscando atrair o cliente para a “melhor joalheria da região” - que é sempre a de quem está lhe entregando o panfleto.
“A rua é como uma ratoeira para ladrões”, explica Edney, zelador de um dos prédios da vilela, composto por lojas e pequenas fábricas. Seu ambiente de trabalho é rebuscado e convidativo, formado inteiramente por mármore claro e brilhante, o que destoa bastante da faixada escura e antiga do prédio. “A rua é muito estreita e pode ser facilmente cercada por policiais no caso de algum malandro querer assaltar”, afirma ele. Edney ainda apelida a Barão de Paranapiacaba como “A rua minada”: policiais estão em todos os cantos, inclusive disfarçados, tornando o ambiente um perfeito campo minado para criminosos.
No meio de toda essa auto-organização de joalherias colocadas uma ao lado da outra está o edifício número 93. Ali, no sétimo andar, em uma sala pequena, apertada e abafada, com câmeras espalhadas por todos os quatro cantos, está escondido José Carlos. Apesar dos 40 anos, “bicho do mato”, como é conhecido na região, é um veterano no negócio do ouro, com 26 anos de carreira como designer de peças e joalheiro, as posições mais altas na hierarquia deste meio. José fala com orgulho de suas qualidades como ser detalhista e ter matéria-prima de qualidade, e se gaba ao dizer que é diferente dos outros vendedores da rua. Ele possui um padrão mais alto e assume que cobra mais, mas com razão: suas peças são exclusivas e de material puro. Portanto, José recusa-se a nomear-se ourives, como disseram que era: ele não compra ouro de qualquer local ou pessoa, como os outros da rua – preocupa-se com a qualidade e a pureza do produto, recorrendo apenas a fontes confiáveis, que são normalmente bancos. Vindo do Amazonas, José está em São Paulo há apenas um ano, vindo para se aprimorar ainda mais na profissão, e acabou se prendendo na ratoeira da Rua do Ouro.
Seu público, assim como o de outras lojas na rua, é formado principalmente por mulheres. A idade varia e os interesses também, mas, segundo Tatiane, uma das recepcionistas da loja ao lado do local de trabalho de José Carlos, “quando não são mulheres procurando joias, são homens procurando para presenteá-las”. Já Edney discorda: o público que passa por sua recepção diariamente é do mais variado. Jovens procuram mais prata, os mais velhos preferem o ouro, mas o local é frequentado tanto por jogadores de futebol, deputados e músicos como por “madames” e “negras da favela”.
Com tantas personagens e personalidades, a rua minada tornou-se conhecida como o melhor lugar para comprar e vender ouro em toda a cidade, apesar de também manter joalherias que vendem peças com preços exorbitantes. Os valores variam assim como seus compradores: tudo depende do fornecedor. Perguntar por uma média é motivo de risada entre os mais experientes, pois não há como prever e muito menos esperar o preço da matéria prima. Esta é a Rua do Ouro, um local formado por diferenças, mas que apresenta indiscutivelmente uma atmosfera única: em sua própria bagunça organizada existe uma harmonia entre ourives, entregadores de cartões, joalheiros, designers, polícias, batedores de carteiras e vendedores. Localizados no coração de São Paulo, todos têm a mesma paixão, seja vendendo, comprando, lapidando ou roubando: o famoso e desejado ouro.