Artigo Teorias Raciais - por Reginaldo Guimarães
Teorias Raciais, um apanhado na história do Brasil
[editar | editar código-fonte]Reginaldo José Guimarães Júnior
[editar | editar código-fonte]Resumo
[editar | editar código-fonte]Este artigo visa trazer ao longo da história do Brasil, como as teorias racistas sempre estiveram impregnadas em obras de literatura, em documentos oficiais, de forma velada ou explicita, mas que sempre estiveram entre nós e que contribuem para o que hoje chama-se racismo estrutural. Passagens de obras de Gilberto Freyre, Monteiro Lobato, pelas tentativas de embranquecimento de Machado de Assis, Henrique Dias e Antônio vieira. Tentarei mostrar como o racismo chegou a ser romantizado, foi pregado nas escolas como atos heroicos de brancos, sendo que os atores do ato eram negros, ou como foi colocado como brincadeira de criança.
Palavras-chave: Racismo, Monteio Lobato, Gilberto Freyre, literatura
Abstract
[editar | editar código-fonte]This article aims to show, throughout the history of Brazil, how racist theories have always been impregnated in works of literature, in official documents, in a veiled or explicit way, but that have always been with us and that contribute to what is now called racism structural. Passages from works by Gilberto Freyre, Monteiro Lobato, through the whitening attempts of Machado de Assis, Henrique Dias and Antônio vieira. I will try to show how racism came to be romanticized, was preached in schools as heroic acts by whites, with the actors in the act being black, or how it was put as child's play.
Keywords: Racism, Monteio Lobato, Gilberto Freyre, literature
Introdução
[editar | editar código-fonte]Durante toda a minha vida acadêmica, até o ano de 2020, estudei, li e usei de literaturas que até então não tinha ideia do conteúdo racista envolvidos com aquelas literaturas. Apenas com o início de meus estudos sobre o movimento Ubuntu, e depois com a disciplina de Educação das Relações Étnico Raciais da UFRPE, foi que comecei a entender mais sobre racismo estrutural, foi que comecei a pensar em coisas que falava/fazia que precisa tirar da minha fala e da minha vida e ainda combater isso em outras pessoas, combater no sentido de tentar conscientizá-los. Recentemente mina esposa, que cursa psicologia na UNICAP, precisou fazer um trabalho sobre Gilberto Freyre e a influências dos vários povos na formação da sociedade brasileira, desse trabalho, ajudando-a na pesquisa e vendo o livro Casa Grande e Senzala, fiquei horrorizado com a maneira como o sociólogo tratava os negros, os indígenas e como ele romantizava um problema sério, cruel e desumano pelos quais esses povos passaram. Resolvi escrever então esse artigo para que pudesse reunir, mesmo que seja uma nano contribuição, mas que ressaltasse esses pontos racistas que mancha a história do Brasil.
Racismo na Literatura infantil
[editar | editar código-fonte]Quem da geração X, nascidos em 60 e 70, não se recordam do famoso Sítio do Pica Pau Amarelo, seja na TV, ou nos livros de Monteiro Lobato, a quem fui muitas vezes incentivado a ler durante meu tempo de escola primária, que fez parte de minha alfabetização e da formação da minha personalidade (pensando na corrente de pensamento que maior parte da personalidade se forma aos 7 anos de idade). A muito pouco tempo fui alertado sobre o conteúdo racista de Monteiro Lobato, tanto de sua literatura quanto de sua vida real. Fazendo uma pesquisa com os termos Monteiro+Lobato+racismo, encontramos uma série de matérias e artigos sobre o assunto, em um dele quero citar passagens do Sítio do Pica Pau Amarelo
"Na casa ainda existem duas pessoas – Tia Nastácia, negra de estimação que carregou Lúcia pequena, e Emília, uma boneca de pano bastante desajeitada de corpo", escreveu Monteiro Lobato em “Reinações de Narizinho”, livro infantil de 1931.
Em várias outras obras, como em “Caçadas de Pedrinho”, de 1933, também podemos observar o uso de expressões de cunho racista e preconceituosas. No livro citado, os termos “macaca de carvão” e “carne preta” são utilizados para caracterizar Tia Nastácia, a cozinheira da casa no Sítio do Pica-Pau Amarelo
“Dona Carochinha botou-lhe a língua – uma língua muito magra e seca – e retirou-se furiosa da vida, a resmungar que nem uma negra beiçuda", narra Lobato.
Agradavelmente tenho esperança de que isso mude e será corrigido cada vez mais ao longo da história, após 70 anos as obras de Monteiro Lobato não estão mais regidas por suas patentes autorais e dessa maneira elas podem ser reeditadas e adaptadas. Vários autores já começaram a fazer esse trabalho de adequação das obras as atuais maneiras de ver o assunto. Por exemplo o autor Pedro Bandeira, de livros marcantes de minha história como a “Droga da Obediência”, já começou a adaptar, por exemplo
No trecho "Dona Carochinha botou-lhe a língua – uma língua muito magra e seca – e retirou-se furiosa da vida, a resmungar que nem uma negra beiçuda", Pedro Bandeira readapta para "Dona Carochinha botou-lhe a língua — uma língua muito magra e seca — e retirou-se danada da vida, a resmungar".
Racismo em Pernambuco
[editar | editar código-fonte]Agora vamos falar de Gilberto Freyre, pernambucano, chamado de comunista desequilibrado, de reacionário racista, conservador retrógado, mas nada disso pode apagar as contribuições do sociólogo notável, mas aqui neste artigo vou me ater na maneira romancista (em minha opinião) de como se tratou o racismo.
A principal obra sobre esse assunto sem sombra de dúvida é a obra Casa Grande e Senzala que foi publicada inicialmente em 1933, em um momento que o Brasil não tinha, talvez, uma visão do racismo como (carece de maior pesquisa histórica) se tem hoje, apesar de pouco se fazer face a tamanha cultura que temos que quebrar e refazer.
Gilberto Freyre também cunhou passagens que poderíamos dizer serem no mínimo ridículas hoje, dada a visão de quem tapa o sol com a peneira para o racismo. Passagens como “o que seria do homem branco de não fossem as negras para inicializá-los na vida sexual?”, “O que seria das mulheres se não houvesse as amas de leite para seus filhos”, ou seja ele sempre tinha uma tirada para que o racismo fosse escondido ou romanceado diante da barbárie que é de verdade, relativizando o problema.
“Suas funções foram as de prestadio mané-gostoso, manejados à vontade por nhonhô; apertado, maltratado e judiado como se fosse todo de pó de serra por dentro; de pó de serra e de pano como os Judas de Sábado de Aleluia, e não de carne como os meninos brancos.”
As passagens dos livros podem deixar estarrecidos que não conhece a obra nem suas circunstâncias:
“... o melhor brinquedo dos meninos de engenho de outrora: montar a cavalo em carneiros; mas na falta de carneiros: moleques. Nas brincadeiras, muitas vezes brutas, dos filhos de senhores de engenho, os moleques serviam para tudo: eram bois de carro, eram cavalos de montaria, eram bestas de almajarras, eram burros de liteiras e cargas as mais pesadas. Mas, principalmente, cavalos de carro.”[1]
Ainda sobre a vida sexual:
“(...) em tudo que é expressão sincera de vida. trazemos quase todos a marca da influência negra. Da escrava ou sinhama que nos embalou. Que nos deu de mamar. Que nos deu de comer, ela própria amolengando na mão o bolão de comida. Da negra velha que nos contou as primeiras histórias de bicho e de mal-assombrado. Da mulata que nos tirou o primeiro bicho-de-pé de uma coceira tão boa. Da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-de-vento, a primeira sensação completa de homem”
“homens brancos que só gozam com negra. De rapaz de importante família rural de Pernambuco conta a tradição que foi impossível aos pais promoverem-lhe o casamento com primas ou outras moças brancas de famílias igualmente ilustres. Só queria saber de molecas. Outro caso, referiu-nos Raoul Dunlop de um jovem de conhecida família escravocrata do Sul: este para excitar-se diante da noiva branca precisou, nas primeiras noites de casado, de levar para a alcova a camisa úmida de suor. impregnada de bodum da escrava negra sua amante. Casos de exclusivismo ou fixação. Mórbidos, portanto, mas através dos quais se sente a sombra do escravo negro sobre a vida sexual e de família do brasileiro.”
Casa Grande e senzala de hoje. Fotos de várias mídias atuais mostram que apenas mudou asa formas e termos, mas a desigualdade social e financeiro, principalmente no Brasil, um dos países mais desiguais do mundo:
Evolução dos novos navios negreiros, não são exclusivos de negros mas são sua maioria e claro são a maioria da população mas mesmo assim são tratados como minoria.
“Foto tirada num BRT lotado na noite da reabertura do comércio no Rio de Janeiro é autoexplicativa. Enquanto o andar de cima celebra a retomada dos negócios, o povão encara o elevado risco de contágio no transporte público lotado”
12 de junho de 2020
Conclusão
[editar | editar código-fonte]Podemos por este pequeno apanhado de duas obras icônicas brasileiras entender um pouco de como o racismo está enraizado desde nossa formação como nação mesmo, apesar das duas obras serem do século XX trazem expressões e pensamentos culturais de vários outros séculos atrás e tratam do negro e do indígena com subpovos, ou povos submissos à raça branca, separando-os sempre de forma muito clara a segregação por cores e mais ainda por posições subordinadas aos mesmos. Gerações e mais gerações cresceram lendo essas duas literaturas e de certa forma devem ter sido influenciadas por elas, não que por si só essas duas obram tenham sido responsáveis pela enraização desse racismo, mas fizeram parte disso junto com livros de história tendenciosos, junto com as representações de libertação dos negros apenas no aniversários da lei áurea, nem de se vestir de índio no dia 19 de abril, e para fechar esse artigo vou deixar uma citação de uma outra passagem do livro Casa Grande & Senzala que vai corroborar com essa minha conclusão.
“Todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo, a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro”
-Gilberto Freyre
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]A POLÊMICA DE MONTEIRO LOBATO EM SÍTIO DO PICAPAU AMARELO: HOMEM DE SEU TEMPO OU RACISMO EXPLÍCITO? [S. l.], 4 jan. 2020. Disponível em: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/polemica-de-monteiro-lobato-em-sitio-do-picapau-amarelo-homem-de-seu-tempo-ou-racismo-explicito.phtml. Acesso em: 7 dez. 2021.
QUEM foi Gilberto Freyre? Conheça a vida e a obra do sociólogo mais importante do Brasil. [S. l.], 7 dez. 2021. Disponível em: https://www.brasilparalelo.com.br/artigos/o-que-gilberto-freyre-defendia?gclid=Cj0KCQiAqbyNBhC2ARIsALDwAsAvrZc5R6xyy0Sm_I20M-_GJnE-g7S-vOTUcHRhGduYbrOLsh1OU7MaAqjwEALw_wcB. Acesso em: 7 dez. 2021.
MONTEIRO, Lobato. Caçadas de Pedrinho, O Saci, Memórias da Emília. 5.ed. ilustr. Manoel v. Filho. são Paulo: Brasiliense, 1973.
MONTEIRO, Lobato. Reinações de Narizinho. 48.ed. ilustr. Manoel v. Filho. são Paulo: Brasiliense, 1993.
O BRASIL de Gilberto Freyre. [S. l.], 2019. Disponível em: https://www.historiadomundo.com.br/curiosidades/o-brasil-gilberto-freyre.htm. Acesso em: 9 dez. 2021.
- ↑ Gilberto Freyre