Jéssica Cristina da Silva
Nome: Jéssica Cristina da Silva nº USP 9275403
A visita a Aldeia Guarani Rio Silveiras faz parte da disciplina Seminários de Políticas Públicas Setoriais 2 - Multiculturalismo e Direitos oferecida pela EACH/USP para os alunos dos cursos de Gestão de Políticas Públicas e Gestão Ambiental. Por tratar de uma disciplina optativa, ou seja, não obrigatória a grade escolar, logo nas primeiras aulas já foi possível entender que os discentes que fariam parte da imersão eram realmente interessados na questão indígena ou que gostariam de entender melhor essa questão e além disso, gerar através das profissões que pretendemos ter uma melhora na condição de vida do povo indígena.
Para realização da visita a Aldeia, houve durante o semestre quatro aulas preparatórias, nessas aulas, discutimos e aprofundamos os aspectos sociais e políticos que envolvem os povos indígenas no Brasil e também abordamos como seria a viagem a Aldeia, quais os materiais seriam necessários. E principalmente, como se daria esse intercambio de culturas, ideias e diferentes modos de vida. O que me fez pensar muito em quais seriam as trocas de experiências entre nós e os índios e como seria para mim, estar num lugar totalmente diferente e novo.
No dia 28 de Outubro de 2016 partimos da EACH USP com cerca de 60 pessoas em um ônibus sentido a Aldeia Guarani Rio Silveiras que se localizada na cidade de Bertioga no litoral Paulista. Havia um clima de curiosidade sobre como seria a experiências na Aldeia mas de forma geral, o clima estava tranquilo. Eu estava junto do grupo das artes e música, que ensaiava as músicas que seriam cantadas durante as atividades na aldeia. Após aproximadamente três horas de viagem, chegamos a aldeia. Minha primeira observação foi durante o trajeto do ônibus na chegada da Aldeia havia muitos indígenas que já nos olhavam e esperavam com curiosidade, curiosidade totalmente recíproca da minha parte.
Chegando ao local, fiquei absurdamente surpresa com a receptividade, principalmente das crianças que logo nos ajudaram a levar as coisas no local em que iriamos acampar e também nos ajudaram a montar as barracas, logo não houve um clima esquisito, me senti muito bem recebida. De forma muito pessoal, esse sentimento de não estranhar o local, de fato, me deixou muito surpresa pois costumo me sentir incomodada em lugares que não conheço. Após a instalação das barracas, fiz um primeiro reconhecimento do local. Como fazia parte do grupo da Infraestrutura fiquei pensando nas coisas faltantes mas tudo estava sob controle. Chegou a hora do almoço, refeição que foi feita pelas mulheres da aldeia.
Após o almoço coletivo, a primeira atividade foi a “Esportes e Gincanas”, que acabou se juntando ao de Brincadeiras. Particularmente falando, tenho certa dificuldade em me relacionar com crianças e nessa atividade fiquei apenas observando. E dessa observação, fiquei absurdamente encantada com as crianças da aldeia. É incrível ver a diferença entre as crianças da “cidade”, eles são calmos, é possível verificar o companheirismo entre eles, como por exemplo, na forma que os mais velhos cuidam dos mais novos. Foi muito divertido vê-los brincar e até me aproximei e conversei com algumas crianças após certo tempo, o que realmente é como vencer uma trava minha.
Logo na primeira noite fomos convidados a irmos a cerimonia na Casa de Reza, onde além do ritual religioso, tivemos uma roda de conversa sobre as lutas sociais e políticas dos indígenas, o modo de vida, as diferenças que inevitavelmente ocorreram com a mudança de gerações e quais são as demandas desse povo, que sempre marginalizados porém resistem e lutam por seus direitos. A experiência religiosa foi realmente algo muito forte para mim. Admito que ao adentrar na casa, não sabia o que esperar mas foi algo mágico. A energia, os cantos e falas do Pajé. Fui acolhida por uma sensação de paz imensa, de conforto. Como se todos ali tivessem ligados por uma corrente de gratidão e foi incrível mesmo. Após a cerimonia na casa de reza, me retirei para um momento de pura reflexão, o que aliás, ocorrera muitas vezes durante a viagem, pois tenho essa necessidade de me afastar um pouco da euforia para entender o que de fato estava acontecendo e para refletir sobre tudo que havia sido tido na roda de conversa.
No dia seguinte levantamos cedo e tomamos café para sairmos para a atividade principal do dia que era a trilha. Particularmente falando, a trilha que era para ser algo tranquilo acabou sendo tensa e cansativa. Tivemos problemas durante o trajeto, o grupo que tinha por volta de 60 pessoas, se dividiu e uma parte (a que eu estava) se perdeu. Isso me fez pensar na falta de companheirismo e empatia dos colegas de curso pois a todo momento pedíamos para esperarmos pois havia gente debilitada conosco, seja por saúde ou por falta de condicionamento físico. Por fim, por esse motivo ficamos perdidos por cerca de uma hora, gerando preocupação ao pajé que acabou cancelando o passeio, gerando frustração e certo desconforto no grupo. Voltamos ao acampamento. Após o almoço, houve diversas atividades e entre elas a Roda de conversa com as mulheres. Foi uma atividade muito enriquecedora, pois não tivemos tanto contato com as elas, assim como com os adolescentes. Conversamos sobre diversos assuntos como a saúde da mulher, casamento, escolaridades, mudanças no modo de viver das gerações e como elas mantém a tradição. A única dificuldade nessa conversa foi a língua, já que elas não são tão fluentes em português e também são bem tímidas.
Após o jantar, fomos para a segunda noite na casa de reza. Porém, dessa vez, foi diferente. Houve uma cerimonia de purificação com alguns integrantes da EACH USP. E foi algo que nunca tinha vivido, a energia do local com toda certeza foi maior do que no dia anterior. Internalizei tanto os cantos num momento de pura conexão interior, que nem ao menos me sentia ali fisicamente. Saí com uma sensação de profunda gratidão e tranquilidade. Finalizamos a noite em volta da fogueira, comendo palmito e compartilhando da tranquilidade da aldeia.
Por motivos pessoais, infelizmente tive que voltar da aldeia no domingo de manhã. A imersão na Aldeia Rio Silveiras me proporcionou um aprendizado que não aprenderia dentro da sala de aula. Desde do começo escolhi fazer essa matéria porque sinto falta dessa prática dentro da universidade mas tudo que vivi foi muito maior do que imaginei. Como futura gestora pública aprendi que a melhor forma de se pensar numa política pública é vivenciar a realidade da população. Cheguei a aldeia com uma série de pré conceitos do que é importante ou na minha cabeça do que é o mínimo para se viver, como chuveiro elétrico ou vários banheiros ou TV mas sai de lá com uma visão bem menos materialista. Com maior convicção da necessidade de coletividade e empatia e do respeito a diferentes culturas e modos de vida. Finalizo meu relato com uma palavra: Gratidão. Profunda gratidão pela oportunidade de “sair da bolha” e por aprender tanto em tão pouco tempo. Gratidão por me sentir tão acolhida por todos da Aldeia. Agora também faço parte da aldeia Rio Silveiras e, com certeza, voltarei em breve.