Saltar para o conteúdo

Memoria

Fonte: Wikiversidade

Trabalho de memória: As greves do ABC paulista

Karolina Romualdo Fraga




Resumo: O presente artigo procura abordar os impactos e memórias deixadas na sociedade brasileira, causadas pelas greves do ABC Paulista, até os dias atuais.




  1. INTRODUÇÃO


1.1: ANOS 70, COMO FOI?

No início da década, o Brasil viveu nos Anos de Chumbo, momento de maior repressão da Ditadura Civil-Militar, marcado por torturas, censura e autoritarismo. A partir de 1974, o Brasil iniciou um processo de redemocratização capitaneado pelos próprios militares, esse processo só se encerraria em 1985.

O período em que os governos militares estiveram à frente do Brasil, entre 1964 e 1985. O período da Ditadura Militar foi um dos mais tensos da história brasileira e ficou marcado pela falta de liberdade, pelo uso de tortura contra os opositores políticos e pela prática de terrorismo de Estado.

A Ditadura Militar foi iniciada por um golpe civil-militar realizado em 1964, contra o então presidente João Goulart. Os militares passaram a impor um regime autoritário que era sustentado por atos institucionais. Ao longo dos 21 anos de ditadura, o Brasil teve cinco “presidentes-generais”. O saldo da ditadura foi de 434 entre mortos e desaparecidos, além da morte de milhares de indígenas. O golpe de 1964 foi a conclusão de um projeto de longa data que visava à derrubada do trabalhismo – projeto que defendia o desenvolvimentismo da economia e a promoção de bem-estar social para a população – e à imposição de uma agenda que promovesse a modernização do Brasil pela via autoritária.

Jango assumiu a presidência, porque Jânio Quadros tinha renunciado ao cargo em agosto de 1961. Como Jango era vice, a Constituição demandava que ele fosse empossado no cargo, o que aconteceu em 7 de setembro de 1961. As tensões que existiam no Brasil aumentaram com o projeto de reformas do presidente conhecido como Reformas de Base.

As Reformas de Base eram um projeto que estipulava reformas estruturais no Brasil, com o objetivo de reduzir as desigualdades existentes e, a partir disso, garantir o desenvolvimento do país. Geraram muita insatisfação, sobretudo a reforma agrária, projeto que garantia acesso à terra aos despossuídos e prejudicava interesses de grandes proprietários de terra.

Além disso, a relação política de Jango com os trabalhadores e os sindicatos era vista pela classe média e alta do Brasil como indício de comunismo. Essa mesma interpretação era feita pelo governo americano em relação a Jango, principalmente, porque aquela época era o auge da Guerra Fria, e os Estados Unidos haviam acabado de passar pela histeria macartista.

Um dos maiores horrores cometidos pela Ditadura Miliar, foi a tortura, que foi uma das formas de perseguir e combater os opositores do regime. A tortura também ocorreu com pessoas que não tinham relação direta com a ditadura, como o caso de filhos de presos políticos que eram torturados para que seus pais denunciassem aliados. A tortura não era só física, mas também psicológica, pois os presos políticos eram deixados por dias em solitárias, sofriam ameaça de terem seus familiares lesados, além de seus filhos serem utilizados pelos militares como fonte de informação. Ao todo, especula-se que cerca de 20 mil pessoas foram torturadas pela ditadura no Brasil.

         1.2 BREVE HISTÓRIA DAS GREVES DO ABC

As greves de 1978-1980 no ABC Paulista foram uma série de manifestações operárias ocorridas na Região do Grande ABC, no contexto de abertura política da ditadura militar, e que marcaram o ressurgimento do movimento trabalhista brasileiro, após a repressão promovida pelo regime entre 1968 e 1972.

O movimento grevista teve início em 1978, com uma série de paralisações espontâneas nas cidades da região do ABC, em especial, no setor dos metalúrgicos, protestando contra as políticas de arrocho salarial e reivindicando liberdade e autonomia sindical.

As greves de 1978-1980 marcaram também o surgimento de um novo sindicalismo, caracterizado pelo tipo de organização que se desenvolveu entre os trabalhadores de base, justapondo os laços do sindicato à rede de organizações da comunidade operária – em especial, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e associações comunitárias –, e pela ascensão de novas lideranças sindicais, como Luiz Inácio Lula da Silva.

A emergência desse novo sindicalismo introduziu entre a oposição política ao regime militar reivindicações da classe trabalhadora a serem alcançadas através da liberalização das instituições e culminou, na década de 1980, na formação do Partido dos Trabalhadores (PT) e de organismos intersindicais de cúpula, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT).

  1. CONGELAMENTO NA MEMÓRIA  

Dado tais explicações e contexto da época, se tem, então, o objetivo do artigo. Como o período ficou marcado na memória dos brasileiros até os dias atuais. Um exemplo é o recente filme lançado nos cinemas: “Ainda Estou Aqui” do diretor Walter Salles. Adaptação de livro de Marcelo Rubens Paiva que estreou em 7 de novembro. Foi de uma memória individual, como meio de entretenimento, para um ainda alerta sobre os perigos do autoritarismo na sociedade brasileira, mostrando para o grande público a importância de relembrar e entender seus perigos para que não aconteça novamente. E assim, comento que, casos iguais a este, de produção de filmes ou qualquer outro meio de entretenimento para exibição as massas, parte sempre da memória, e que ainda permanecem nas memórias, mesmo depois de anos do acontecimento. Tal acontecimento gravado na mente daquele que viveu ou se informou sobre, traz a atitude de preparar formas de repassar sem mais nem menos, exatamente como foi ou é, á diante, para conhecimento geral e assim, uma memória coletiva.

As greves do ABC Paulista, especialmente as que ocorreram no final da década de 1970 e início dos anos 1980, deixaram um legado profundo na sociedade brasileira. Essas greves, lideradas por trabalhadores das indústrias automobilísticas e metalúrgicas da região do ABC, foram um marco na luta por direitos trabalhistas e na resistência contra a ditadura militar.

Essas greves foram fundamentais para a formação de uma nova consciência política e sindical no Brasil. Elas ajudaram a fortalecer o movimento sindical, que passou a ter um papel mais ativo e combativo na defesa dos direitos dos trabalhadores. Além disso, as greves do ABC Paulista foram um dos fatores que contribuíram para a criação do Partido dos Trabalhadores (PT) e da Central Única dos Trabalhadores (CUT), duas importantes instituições na política brasileira.

As greves também tiveram um impacto significativo na democratização do Brasil. Elas mostraram a força e a organização dos trabalhadores e ajudaram a pressionar o regime militar a iniciar um processo de abertura política. As greves do ABC Paulista são lembradas como um símbolo de resistência e luta por justiça social, e seu legado continua a influenciar o movimento sindical e a política brasileira até hoje.

Essas memórias são celebradas em diversos eventos e homenagens, e a região do ABC Paulista é frequentemente lembrada como um berço de importantes movimentos sociais e políticos no Brasil.

De fato, se teve um ponto na linha do tempo que marcou um importante início de acontecimentos para que anos depois, em acontecimentos diferentes, a mesma forma de protesto seja linha de frente novamente. As greves dos metalúrgicos são lembradas como um marco na resistência e luta por melhores condições de trabalhos e direitos sociais. Essas greves tiveram um papel fundamental na pressão pela redemocratização no Brasil.

Outro ponto, Lula, um dos líderes sindicais mais proeminentes do ABC, tornou-se uma figura nacional e posteriormente foi eleito presidente do Brasil. Sua atuação durante as greves e sua trajetória política são parte importante da memória coletiva da região e do país. O ABC Paulista foi o berço do PT, partido que surgiu das lutas sindicais e movimentos sociais da região. A fundação do partido é lembrada como um momento de organização política dos trabalhadores e de busca por uma representação mais efetiva nos espaços de poder. A região do ABC é lembrada não só pelas lutas sindicais, mas também por sua rica cultura operária, suas tradições e a forte comunidade de trabalhadores que ajudou a moldar a identidade local e nacional. As histórias de resistência e solidariedade são passadas de geração em geração.

São passadas e como sucedeu para atualmente. No dia 14/11/2024, trabalhadores das empresas terceirizadas que prestam serviço à unidade do ABC Paulista da Braskem, em São Paulo, realizaram uma forte paralisação em defesa de um piso salarial, denunciando as duras condições de trabalho na petroquímica.

Foram realizadas entrevistas pelo jornal A Verdade, onde explicam as razões da greve. São contratados pela Braskem com salários baixos e vínculos trabalhistas precários para realizar serviços fundamentais para o funcionamento da produção, manutenção de máquinas, montagem de caldeiras e vários outros trabalhos. Seus contratos podem ser quebrados a qualquer momento e, exatamente por conta desse regime de trabalho, os salários estão sempre diminuindo e a exploração aumentando.

Em sua paralisação, os trabalhadores defenderam que sejam instituídos salários iguais para quem faz a mesma função não só entre os funcionários diretos da Braskem, mas também para os terceirizados que prestam serviço para a empresa. Outra denúncia realizada pelos trabalhadores é o excesso de trabalho que as empresas têm cobrado.

É um exemplo de como as greves sempre será uma forma eficiente de manifestação, e que sempre estará na memória coletiva dos brasileiros, já que tal forma, sempre é utilizada em casos socias. No jornal A Verdade, é colocado o seguinte ponto: “Como vem agitando o Movimento Luta de Classes em suas ações de solidariedade à luta na empresa, as greves continuam sendo a melhor arma dos trabalhadores para conquistar melhores salários, derrubar as terceirizações, revogar a Reforma Trabalhista e a Reforma da Previdência, acabar com a escala 6×1 e conquistar uma sociedade socialista.” Historicamente, as greves têm sido catalisadoras de mudanças políticas e sociais.

Nas pesquisas sobre o ABC, foi encontrado um documentário: GREVE! (1979) do diretor João Batista de Andrade, que segue com imagens não exibidas na Tv e entrevistas de trabalhadores que participaram. Apontam as péssimas condições de trabalho na Volkswagem, e no documentário mostra o contexto econômico que amassava os metalúrgicos, gerando mais capital estrangeiro, sem volta para os trabalhadores. Todos pobres, enfrentando dificuldades e numa entrevista com uma metalúrgica, na minutagem 10:25, ela diz que “é difícil, mesmo com criança tem que enfrentar e o salário é baixo” e usa a expressão “mas dá pra quebrar o galho”.

É perguntado para João Batista como é a vida do metalúrgico, na sequência João responde: “não dá nem pra explicar como que é, do jeito que eu trabalho dava pra ganhar mais ou menos, mas esse salariozinho...” João não termina a frase, mas dá a entender o fato de que o esforço do trabalho é muito maior que o salário. É também interrogado sobre o que faz fora das fabricas, e o entrevistado diz que não faz nada, dando a entender pela falta de tempo e que não tem condições de comprar um carro. Parecido com os dias de hoje, já que um dos motivos para o fim da escala 6x1, assunto que agora percorre a mídia, é exatamente o excesso de trabalho e tempo exercido nas fabricas, tirando o lazer e a vida do trabalhador, dentro de condições precárias e salário incondizente. Há outras entrevistas mostrando a visão dos trabalhadores e mostrando os acontecimentos no ABC.

O documentário aborda de fato o que acontecia nas ruas durante o período através dos participantes e dos compromissos tomados por todos durante as greves. Quando trabalhadores se unem em greve, eles criam uma voz coletiva que é muito mais difícil de ser ignorada do que um protesto individual. Deixando um legado duradouro de luta e conquista que permanece na memória.


BIBLIOGRAFIAS  

https://www.historiadomundo.com.br

https://memoriaglobo.globo.com/jornalismo/jornalismo-e-telejornais/jornal-nacional/reportagens-e-entrevistas/noticia/greves-no-abc

Trabalhadores da Braskem do ABC Paulista fazem paralisações por piso salarial - A Verdade

Operários – Memorias da Ditadura

Greve! João Batista de Andrade (1979) - YouTube