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Pesquisa sobre o espectáculo « você está aqui »

Fonte: Wikiversidade

Este trabalho foi realizado no contexto de uma cadeira da faculdade das letras da Universidade de Coimbra que se chama “músicas étnicas” e que foi leccionado pela professora Susana Sardo. O trablho foi entregado em junio 2009 e a nota de evaluação foi 16/20. As informações estiveram colectadas durante a participação activa na preparação e apresentação do espectáculo « você está aqui » (video youtube), durante várias pesquisas bibliográficas e discográficas e durante uma entrevista com duas pessoas ( João e Adérito ) que foram os dois principais coordenadores dos ensaios do espectáculo. Este trabalho tem por objectivo permitir aos leitores, descobrir uma pequena parte da imensa cultura popular de Portugal em termos de músicas, danças, instrumentos, e também oferecer uma oportunidade de descobrir o grupo GEFAC. O trabalho será estruturado em quatro partes que serão: a apresentação do GEFAC, a apresentação dos instrumentes musicais usados pelo GEFAC e a apresentação do espectáculo “você está aqui” para acabar com uma reflexão geral sobre a evolução das músicas tradicionais em geral. Em anexo, esta a apresentação do conteúdo do espectáculo, as origens das danças e das músicas, as letras das canções, a apresentação das outras performances do espectáculo.

Apresentação do GEFAC

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No sitio Internet do GEFAC ( www.uc.pt/gefac ) no dia 22 Junho 2009, podemos ler este apresentação do grupo.

“As diversas manifestações da cultura popular constituem, por excelência, o momento em que um povo fala lealmente de si, o momento onde um povo se revela na sua maneira de ser própria.

Enraizado nesta consciência, o Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra (GEFAC) é fundado como Organismo Autónomo da Associação Académica de Coimbra em 1966, tendo desenvolvido desde aí um exaustivo trabalho de recolha, tratamento e divulgação das manifestações tradicionais.

O GEFAC utiliza as manifestações populares numa perspectiva criativa, principalmente nos ajustamentos aos aspectos cénicos, que permitem produzir um espectáculo globalizante, não tanto empenhado em demarcar regiões, mas sim em acentuar o sentir que provocou o aparecimento das manifestações. Os espectáculos gerais realizados pelo grupo (como o último "A Água Dorme de Noite") são exemplo do tipo de espectáculos que se têm vindo a fazer ao longo de 40 anos de actividade. Realmente, neste esforço de divulgação, o GEFAC já apresentou cerca de 800 espectáculos, quer no país quer no estrangeiro, bem como várias gravações para algumas televisões europeias. O GEFAC tem ainda em cena um texto de teatro popular mirandês - "Comédia do verdadeiro Santo António que livrou seu pai da morte em Lisboa" - resultante de um exaustivo trabalho de recolha de textos na região de Miranda do Douro, já publicado em livro. Correlativamente a esta actividade, têm-se vindo a realizar bienalmente as Jornadas de Cultura Popular, com o intuito de promover o encontro de cada cidadão com a sua própria cultura e com a cultura de outros povos.”

Neste apresentação algumas informações são um bocadinho obsoleta. O último espectáculo não foi "A Água Dorme de Noite" mas “você esta aqui” e GEFAC já pode compatibilizar 43 anos de existência e não 40. Durante as minhas pesquisas sobre o assunto do espectáculo tive a oportunidade de ler um texto de apresentação do espectáculo "A Água Dorme de Noite" encontrei algum informações mais actuais. Aqui podemos ver a evolução do texto em caracteres em negrito.

“O Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra (GEFAC) é fundado como Organismo Autónomo da Associação Académica de Coimbra, em 1966, com o propósito de recolher, analisar e interpretar as manifestações culturais,  individuais e colectivas, das populações rurais nas suas diversas vertentes: cantares, música instrumental, danças, teatro, usose costumes,  tendo desenvolvido, desde a sua fundação, um exaustivo trabalho de recolha, tratamento e divulgação das manifestações tradicionais portuguesas. O GEFAC utiliza as manifestações populares numa perspectiva criativa, principalmente, nos ajustamentos aos aspectos cénicos, que permitem produzir um espectáculo globalizante, não tanto empenhado em demarcar regiões, mas sim em acentuar o sentir que provocou o aparecimento das manifestações.

Os espectáculos gerais realizados pelo grupo, como o último “Poucaterra” , são exemplo do tipo de espectáculos que se têm vindo a fazer ao longo de 43 anos de actividade. Realmente, neste esforço de divulgação, o GEFAC já apresentou cerca de 800 espectáculos, quer no país quer no estrangeiro, bem como, realizou várias gravações para algumas televisões europeias.

O GEFAC tem ainda em cena um texto de teatro popular mirandês - "Comédia do verdadeiro Santo António que livrou seu pai da morte em Lisboa" - resultante de um exaustivo trabalho de recolha de textos na região de Miranda do Douro, já publicados em livro.

De salientar, no seu percurso criativo, a institucionalização, há 30 anos, das Jornadas de Cultura Popular, uma realização bienal do grupo que tem proporcionado, à cidade de Coimbra, múltiplos momentos de reflexão sobre a cultura popular, quer através de colóquios e mesas-redondas, como também pela realização de exposições, de espectáculos de grupos portugueses e estrangeiros, manifestações de rua, etc. Participa no FATAL pela segunda vez.”

Estas presentações, queria adicionar algumas informações, algumas coisas que eu descobri durante as minhas várias participações nas actividades do grupo e que têm muita importância.

O GEFAC para mim, foi sobretudo um grupo com vários pessoas (cerca de 60), estudantes, trabalhadores antigos estudantes da universidade ou não, que se reúnem para partilhar uma paixão comun da cultura portuguesa, da música, da dança e do teatro... O GEFAC e um grupo mas também um lugar consistido de quatros salas: um secretário, uma sala de reunião que serve também de local para colocar os materiais bibliográficas e discográficos, um local para amurar os trajes e instrumentos antigos, uma sala de ensaio de teatro e danças e uma sala para colocar os materiais de música e de sonorização, sala que também pode ser usada para ensaios de música.

Para mim, o papel importante do GEFAC foi de ser um lugar ( no sentido de espaço físico mas também espaço de encontro humano ) para descobrir, de uma maneira activa, a cultura tradicional portuguesa. O GEFAC tem “cerca de 800 espectáculos”, mas também 43 anos de organização dos vários workshop de dança, teatro, música e também 43 anos de ensaio semanal nas suas três disciplinas que são a dança a música e o teatro. A organização dos ensaios, é aberta para cada um. Os ensaios são mais ou menos repartidos em três noites, das vinte e meia da tarde até cerca da meia noite. Cada disciplina tem um pessoa que organiza o ensaio e para a parte musical, é possível também de ter aulas particulares.

Vários cabeças dos bonecos usadas nos espectáculos anteriores

A participação nas actividade é aberta e livre. Por exemplo João, entrou para tocar o cavaquinho em 2000, aprendeu a tocar concertina e fica ligada a tocata até agora. Adérito entrou em 1986 e o seu “Interesse inicial fui fazer teatro” mas passou “rapidamente pelas danças por que no teatro não se faziam ensaios neste altura e também, nas danças avia mais raparigas...”. Diz também que “nunca cantei nem toquei no GEFAC”. Nos Últimos anos Adérito e João estiveram ligados à coordenação geral dos espectáculos. O Adérito é o mais antigo do grupo e responsável da parte teatral e da iluminação e João está mais ligado à parte musical e responsável pela sonorização dos instrumentos.

GEFAC é também um lugar com uma “cultura material”. O grupo tem vários materiais. Já falamos da biblioteca e da media-teca, mas o GEFAC usa e tem todos materiais de sonorização e de iluminação para produzir os seus espectáculos, mais também trajes tradicionais, mascaras e mascaradas, assim como as suas próprios instrumentes de música.

Apresentação da malhor parte dos instrumentos de música de GEFAC

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Aqui vão aparecer as fotografias e as presentações de todos os instrumentos usados pelo GEFAC. Os instrumentos com um * foram instrumentos usados durante o espectáculo “você está aqui”. A grande parte dos cordofones ( cavaquinhos, violas bragesa e beiroa, sanfona …) eram fabricados por Fernando Meireles, um artesão que tem a sua oficina no edifício da associação académica de Coimbra. A descrição de alguns instrumentos foi feita em referência da obra de VEIGA DE OLIVEIRA, E. “Instrumentos musicais Populares Portugueses” (VEIGA DE OLIVEIRA, 2000).

O cavaquinho
  • Dois cavaquinhos, instrumento de quarto cordas metálicas, com dois diferentes sistemas de afinação (da guitarra clássica em baixo e de guitarra portuguesa em cima). O cavaquinho que pode ser considerado com um dos instrumentos nacionais de Portugal, pode ser afinado de várias maneiras. No GEFAC é costume usar a afinação -do4 -sol3 -lá3 -ré4 (de cima a baixo em posição normal de tocar).
A viola braguesa
  • A viola bragesa (do nome da cidade de Braga) e um instrumento com dez cordas de metal (cinco pares), com pelo cavaquinho, existe vários afinação. No GEFAC é costume usar a afinação - ré2 + ré3 - là2 + là3 - si2 + si3 - mi3 + mi3 - lá3 + lá3 (de cima a baixo em posição normal de tocar).
A viola beiroa (em baixo) e a viola bragesa (em cima)
  • Estas duas violas têm sistema de afinação da guitarra portuguesa. A viola beiroa do GEFAC está actualmente defeituosa e não afinada, mas de acordo com VEIGA DE OLIVEIRA, a afinação da viola beiroa, originaria da região Raiana corresponde, do agudo para grave, a ré3 -ré3 -là2 -fá sustenido2 -si1.
A bandolim
  • O bambolim não é um instrumento tipicamente português mas usado na tradição popular. Este instrumento tem quatros pares de cordas de metal. Cada par são duas cordas afinadas de maneira igual e os pares são afinadas em -sol2 -ré3 -la3 -mi4 (de cima a baixo em posição normal de tocar) O violão baixo e guitarra baixa electroacústica*
O Violão baixo em sima e guitarra baixa electroacústica em baxo
  • O Violão baixo é um instrumento português, mas o GEFAC tem por habito de usar uma guitarra baixa electroacústica. Os dois instrumentos são afinados de mesma maneira, mi1 -là1 -ré2 -sol2 (de cima a baixo em posição normal de tocar)
A guitarra clássica
  • Aqui são dois tipos de guitarra clássica. O formato da caixa da guitarra de baixo ajuda o musico para ter aceso aos sons mais altos. A Guitarra é com certeza um dos instrumentos mais conhecidos e mais distribuído no mundo. A afinação é mi2 -là2 -ré3 -sol3 -si3 -mi4 (de cima a baixo em posição normal de tocar)
A sanfona o mecanismo rotativo e de fixação das cordas
A sanfona o mecanismo de afinação e o sistema de alteração dos sons.
  • A sanfona é um instrumento muito antigo mas também muito elaborado. Este instrumento desapareceu de Portugal mas esta a voltar de novo. Aqui em cima podemos ver o mecanismo de afinação e o sistema de alteração dos sons. Esta sanfona tem seis cordas três cantantes ( dois em uníssono e uma em oitava), dois que fazem o papel do bordão e uma corda, a chanterelle, que permite fazer um efeito rítmico em acordo com a velocidade da roda. A vario possibilidade de afinação para cada corda e a sanfona do GEFAC é lá3 -sol3 -lá4 -do4 -ré3.(de cima a baixo em posição normal de tocar).
As flautas
  • As flautas usadas pelo GEFAC são de madeira e de vários tonalidade fá, do, .... Aqui estão dois exemplos, uma flauta em fá com oitava de diferença.
A gaita-de-foles galega
Pahletas e válvula da gaita-de-foles galega
  • Existem gaitas-de-foles de várias tonalidade mas as gaitas usadas pelo GEFAC são em dó maior. A gaita aqui presente na fotografia não é do GEFAC mas é equivalente. Os tubos das gaitas são feitas de madeira de várias qualidades e o fole pode ser feito de pele, borracha ou gore-tex. Na próxima fotografia podemos ver, o sistema de válvula das palhetas (com duas partes vibrante pelo punteiro e só uma pelo ronco). Na seguia fotografia em cima estão as duas palhetas dos ronco, em baixo à esquerda a válvula do assoprador e em baixo à direita a palheta do ponteiro
A Corneta
  • A corneta é um instrumento que nunca fui usado durante o tempo que eu frequentei o meio do GEFAC, sé caiar ele é usado só com acessório de teatro. Este corneta é em si bemol.
A concertina (direita) e o harmónio (esquerda)
  • A concertina (direita) e o harmónio (esquerda) são instrumentos diatónicos que produzem um som diferente quando o fole é puxado o empurrado. O harmónio tem só dois botões para tocar o acompanhamento e só uma fila de botões para tocar a melodia. A concertina de direita tem oito botões para tocar acompanhamento e duas filas de botões para tocar melodia. Estes instrumentos são feitos para tocar principalmente na tonalidades de dó maior e lá menor (também sol maior pela concertina).
O Bombo
  • As caixas dos bombos ( tambor mais baixo) podem ser feitas de madeira ou metal e a pele é de vaca ou de cabra.
A caixa
  • A caixa da caixa pode ser feita de madeira ou metal. A caixa tem, encostada a uma das duas peles uma corda para produzir um som mais mais agudo.
O timbalão
  • O timbalão é um tipo de caixa mais alta, sem corda encostada à pele e sempre com uma caixa de madeira. Igual à caixa, o timbalão é tocado com vários utensílios durante a pratica da música no GEFAC.
O Adufe
O Adufe estragado e suas guizos
  • O Adufe é um pandeiro bimenbranofone que se toca com as mãos. Dentro do instrumento podem-se colocar alguns guizos para produzir um som adicional. Uma das características do adufe e outros instrumentos de percussão com membrana de pele é que a tenção da pele é sempre muito fraca. Notei nos instrumentos do GEFAC e também nos instrumentos que eu encontrei em Portugal.
Vários utensílio para tocar bombo, caixa e timbalão
  • Cada utensílio usado para tocar os tambores produz sons diferentes
A sarronca e o cântaro
  • A sarronca é um membranofone que produz um som quando a vara de madeira é esfregada com a mão. O cântaro é usado com a mão ou um utensílio sobre a parte aberta para produzir um som baixo.
O cajon de costa
O cajon de frente
  • O cajon é um instrumento típico da Andaluzia e usado para tocar o flamenco com os mãos. No GEFAC este instrumento pode ser tocado com escovas também.
Os vários idiofones e instrumento avulsos
  • Podemos ver aqui um ferrinho, as pinhas, a clave, a campainha, o pandeiro da folia, o crivo com milho. Na cultura portuguesa podem também ser utilizados conchas, seixos e castanholas.
Os paus e o genebres
  • Os paus que são usados por as danças dos pauliteiros (Miranda de Mouro) forem usados durante o espectáculo para substituir os genebres, que são instrumentos tradicionais parecidos aos paus alinhados e usados para a música da dança dos homens.
Djembe e pau de chuva
  • Existem também no GEFAC instrumentos mais exóticos como o djembe, originário da cultura mandinga da África de oeste e que pode ser considerado quase uma moda musical há já alguns anos tal como o pau de chuva, que tem um origem de América central.

Apresentação do espectáculo « Você está aqui » ( http://www1.ci.uc.pt/gefac/espectaculos/gerais_vea.htm )

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O espectáculo em geral

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Os espectáculos do GEFAC são criações colectivas, como pode confirmar João quando disse que “Juntávamos um pequeno grupo aberto a toda gente, mas aparecia sempre pouca gente”. São assim quatro a seis pessoas que se encontram cada semana para trazer novas ideias. E para Adérito os espectáculos são uma ocasião de “mostrar um pouco de tudo o que se faz no GEFAC” .

Nos espectáculos do GEFAC, em geral, as pessoas trabalhavam muito sobre a parte musical, sobre os movimentos, mas como testemunha João, “as danças continuamos apresentá-las como eles são [...] já há muito tempo que nós queríamos trabalhar esta era das danças […] infelizmente no GEFAC não estava ninguém com esta capacidade”. Assim GEFAC procura uma pessoa para ajudar-los neste caminho e foi Clara Andermatt “que acabou por vir para cá uma semana e trabalhar connosco. Muito do espectáculo foi o trabalho dela”. Aqui podemos ler um texto de apresentação do workshop:

“Este workshop, dirigido pela coreógrafa Clara Andermatt, procura trabalhar com alguns membros do Grupo de Etnografia e Folclore da Universidade de Coimbra (GEFAC) novas formas de viver, expressar e dançar o corpo, num encontro que será, também, partilha de saberes e vivências entre ambas as entidades artísticas. Partindo do tema da XI Semana Cultural, Velocidade e Movimento, esta experiência vai permitir explorar, de um modo inovador, as potencialidades expressivas dos gestos, hábitos e danças tradicionais, frequentemente procurados no mundo rural, e revelar o seu ponto de fusão com aqueles que se sentem ser os ritmos do quotidiano urbano. Quem sabe se desta vertigem de linguagens não se descobre, afinal, um mesmo corpo, contador de histórias e confessor de memórias… Dessas que se levam, distraidamente, nas viagens entre os lugares.”

Como o espectáculo antecedente, “Você está aqui”, foi também realizado no contexto da semana cultural da universidade que tinha por tema “velocidade e movimento”. A este espectáculo junte-se também uma Proposta do departamento de informáticia para participar com um programo de tratamento vídeo.

Neste contexto, o GEFAC pensava fazer um espectáculo mais urbano e João considera que “foi bastante difícil no princípio”. Para Adérito, já há alguns anos que o GEFAC quer trabalhar com um aspecto mais urbano, e foi uma oportunidade de “usar uma tecnologia de vídeo que tinha uma estética própria”. O GEFAC acha “que foi uma oportunidade de trabalhar uma estética mais urbana neste espectáculo”

Sobre uma página do site do colectivo Rodobalho que assume o papel da organização e promoção das actividades de danças e música “folk” em Portugal, podemos ler a sinopse do espectáculo seguido do Processo criativo (http://www.rodobalho.com/divulgacao/voc-esta-aqui-com-o-gefac-080509.html 22/06/2009). Aqui é a parte do texto que parece resumir a ideia do espectáculo: “ Queremos explorar também, de modo inovador, as potencialidades expressivas dos gestos, hábitos e danças tradicionais, frequentemente associados ao mundo rural, para revelar o seu ponto de fusão com aqueles que se sentem ser os ritmos do quotidiano urbano.” Aqui é o texto integral: “Neste novo espectáculo, o GEFAC procura ir além das suas raízes, fundindo as tradições populares que até agora têm guiado o seu trabalho, com os ritmos e vivências contemporâneos das cidades.  

As cidades são espaços de mudanças rápidas, onde impera a velocidade, mas também locais moldados pelas suas memórias. Neste espectáculo queremos olhar para o espaço urbano e encontrar as suas memórias, procurando nos becos e esquinas, nas varandas e nos telhados, os segredos que têm para nos contar.   Num espectáculo onde prevalece uma opção pela linguagem corporal, partimos dos gestos do quotidiano, compilando-os, distorcendo-os, aumentando-os, para assim brincar com o conceito da velocidade corpórea inerente a todos os espaços urbanos. Queremos explorar também, de modo inovador, as potencialidades expressivas dos gestos, hábitos e danças tradicionais, frequentemente associados ao mundo rural, para revelar o seu ponto de fusão com aqueles que se sentem ser os ritmos do quotidiano urbano.   Quem sabe se desta vertigem de linguagens não se descobre, afinal, um mesmo corpo, contador de histórias e confessor de memórias… Dessas que se levam, distraidamente, nas viagens entre os lugares e que nas quais já perdemos o mapa.

Processo criativo

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Se falamos do nosso próprio percurso, ou do percurso do espectáculo, talvez seja mais ou menos irrelevante desvendar. Encarámos sempre a nova produção do GEFAC como lugar pretendido de transição e mudança, não só em relação àquilo que constitui o produto artístico, como no que diz respeito à própria apresentação pública do grupo. Se, por um lado, debruçaríamos a temática do espectáculo sobre os espaços de transição, pretendíamos também que o espectáculo se afirmasse em si como reflexo de uma mudança-renovação no modo de pensar e operar de um organismo que conta já com 43 anos de existência. Construindo o nosso objecto artístico através de recursos tecnológicos, construções de cenário não convencionais ou figurinos adaptados à estética e às necessidades actuais, estaríamos a demarcarmo-nos de uma estética da etnografia tradicional que encara o etnográfico – ou seja o popular, o nacional – como antigo, rural e regional, e, ao mesmo tempo, estaríamos a promover um reencontro mais genuíno do GEFAC com aqueles que são os seus objectivos mais primordiais, específicos e singulares.

A nossa motivação para o presente espectáculo centrou-se, desde o início, na busca de memórias definidoras do espaço urbano. Fomos procurá-las às cidades, é certo, mas não adoptámos a visão linear de uma dicotomia rural/urbano que está sempre presente quando se pensa na caracterização da realidade nacional. O que pretendíamos com esta proposta era percorrer o caminho em sentido inverso: valorizar os aspectos relacionados com a contaminação do rural pelo urbano, explorar as tonalidades difusas da transição entre estas realidade, realçar a leitura que o urbano faz de si mesmo ao rever-se no rural, procurando as semelhanças e evidenciando os contrastes. No fundo, queríamos procurar a ruralidade em contexto urbano e a urbanidade em contexto rural. Enfim, a cidade é o lugar de muitos lugares. E por isso haverá dela tantas visões diferentes como as pessoas que sobre ela querem ter uma visão… Aqui deixamos a nossa.”

A este texto de apresentação podemos adicionar uma introdução que figura na capa de apresentação do espectáculo e que da uma visão mais poética do espectáculo.

“De onde vimos e para onde vamos serão sempre as perguntas mais importantes a fazer, quando de facto queremos chegar a algum lado… Pegamos na troucha das nossas memórias - as caras, os gestos, os sons que conhecemos - e arrancamos de alma a puxar o corpo rumo a esse qualquer lugar desejado que habitaremos de ideias e histórias, também elas futuras memórias… Pelo caminho, fica tanta coisa que deixámos de querer transportar…e outras que na viagem se transformaram, se acrescentaram. Mas de onde partimos, será essa a história inalterável?”

Para acabar este apresentação geral, queria dizer que durante minha participação descobri um grupo muito aberto para discutir as coisas em curso de elaboração. Esta maneira de funcionar para mim foi, às vezes, um bocadinho confusa, mas tinha a surpresa de ver que no fim as coisas sempre acabavam por correr bem. A organização caótica acabava por ser um caos organizado. E por isso que durante a tertúlia que seguiu ao espectáculo no festival de teatro universitário “ Fatal”, acabei para usar da palavra “bruxaria” para qualificar o processo de elaboração do espectáculo.

Do ponte de vista cenográfica “Você está aqui” fui também uma inovação pelo GEFAC. O público é colocado em dois lados e duas estruturas servem para as projecções videograficas existia também um sistema de ocultação entre o público e os bastidores. Aqui em baixo um ilustração da cenografia:

escola estadual cejo

O GEFAC tem recolhas das danças, principalmente de Trás-as-Montes, mas muitas danças são trazidas com as pessoas que vem para o GEFAC. Neste espectáculo, estavam três danças, uma Transmontana ( Galandum), duas da Beira litoral (Besbiana e Marcadinho) e uma do Minho (Vira do salto). Como pode dizer Adérito, “nunca tinhas tão poucas danças no espectáculo” e acrescente que “as danças são aquilo que nós temos mais dificuldade em conseguir de ligar com a estética, com a ideia do espectáculo […] qual é a motivação para que de repente um conjunto de pessoas punham os braços no ar para dançar”. É verdade que no contexto da cidade estas motivações são mais difíceis de apanhar.

A escolha das danças fui por várias razões mas “As danças do Galandum e vira do salto foram usadas no trabalho de Clara Andermatt” testemunha Adérito. Quando Adérito fala das danças devemos precisar que ele fala fala só das danças no sentido “danças tradicionais” porque na verdade existem todo o longo do espectáculo várias performances semelhantes à danças contemporâneas. Este facto pode talvez denunciar a situação de mudança que fui este ultimo espectáculo no contexto dos hábitos de GEFAC.

Até o final dos anos oitenta o GEFAC fez muitas recolhas de música nomeadamente na região transmontana e na região da Beira baixo. Estas recolhas estão na mediateca com outras recolhas de autores mais conhecidos, tais como Michel Giacometti. Por exemplo, a música do cego usada no início do espectáculo com a sanfona foi recolhida de um trabalho de Manuel Rocha que seguiu os mesmos passas de Giacometti. Durante o espectáculo, nas escolhas das músicas, o GEFAC tenta seguir ideia geral do espectáculo para o sentido urbano. De acordo com Adérito, “as músicas açorianas têm referências muitas próximas do fado” as música das ilhas “vai de roda” e “Cantiga da Serra” são de facto “menos conhecidas e não são tão associadas a sonoridade do rancho folclórico”. Outras músicas, como por exemplo “Encomendação das Almas” são “completamente tiradas de um contexto rural mas como o espectáculo tem vídeos […] não fosse associada a este ruralidade” explica Adérito.

No caso do Galandum, o GEFAC trabalhou a música para manter o ritmo que permitisse de dançar. Eles queriam “fugir desta linha da gaita-de-foles, que é muito terra”. A melodia foi tocada com uma flauta sobre uma banda sonora feita de sons da cidade com carros a passar e ruído urbano, de tal forma a manter uma linha melódica e rítmica que permitisse as danças serem dançadas.

Aqui também podemos ver que o GEFAC é inovador, porque foi a primeira vez que eles usaram as músicas gravadas para um espectáculo. A inovação e criatividade está também na produção de uma música original para uma cena especificamente urbana. Esta música gravada também foi uma colagem de sonoridades de trabalho, cavadores, borracheira e dos seus gritos mútuas. A ideia, como disse Adérito, foi de “retratar o stress quotidiano citadino com musicalidade rural”.

Por fim podemos dizer que este espectáculo foi uma grande inovação do GEFAC, muitas portas abertas, muitos riscos mas também um ocasião para fazer muitas coisas que o grupo queria fazer antes, mas que nunca tinha tido a oportunidade. Neste contexto a critica não foi construtiva por parte de alguns membros mais antigos, mas foi de facto uma rejeição. Como pode testemunhar Adérito, alguns “se chocaram com o espectáculo, o que nunca tinha acontecido antes” Mas para o GEFAC é também um “esforço para continuar este processo criativo e manter certa a tradição” e para o João o espectáculo foi um catalisador de muitas coisas que já estavam a pensar e que correu bem.

Reflexão geral sobre a evolução das músicas tradicional

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Este trabalho dá-nos um exemplo da dificuldade de pensar a tradição num contexto de evolução. Na palavra tradição, o sentido de imobilidade, de perpetuação que fica, mas a tradição é uma coisa que sempre evolui. As tradições de cada século foram diferentes e cada tradição de cada pais é sempre influenciadas pelas tradições dos outros pais. Devemos então pensar a tradição talvez no sentido da cultura e como uma coisa que esta sempre evoluir. Podemos também falar de conservadorismo quando nós queremos que as coisas fiquem sem mudar.

Nós vivemos numa altura de extrema mudança com as novas possibilidades de comunicar, de viajar, partilhar, … Ninguém pode dizer quais serão as tradições do futuro, tanto que nos falamos das tradições de hoje. Só podemos ter uma posição sobre a evolução das coisas, ter uma atitude progressista ou conservatória. Isso é só um questão de convicção e é bom que cada um guarde a sua liberdade de considerar as coisas e conceptualizar o mondo à sua maneira.

  • AROM Simha & ALVAREZ-PÉREYRE Frank 2007 Précis d'ethnomusicologie. Paris , CNRS
  • VEIGA DE OLIVEIRA Ernesto.Instrumentos músicais Populares Portugueses. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian/Museu Nacional de Etnologia, 2000

Letras dos vários cantos (tradicionais) do espectáculo.

1ª CENA: A cidade que se revela

Dança dos homens, Lousa, Beira Baixa

Cego Andante, Coimbra, Beira Litoral

2ª CENA: Um palco denso de actores

Galandum, dança transmontana Original com excertos da Bacelada (Figueira da Foz, Beira Litoral) e Canção dos Borracheiros (Porto da Cruz, Madeira)

Ai non Galandum Galandum galandaina Ai non Galandum Galandum galandaina La madre i la biscaia Com las três traseiras Com las de lantreiras Dá-me la mano esquierda Que you dou la derecha Arredem-se atrás Faz-me lá reverência Ai nô nô que me dá la vergonha Ai que manda el rei que manda la justiça Ai que manda el rei que manda la justiça Essas bailadoras que se caiam com la riça Que se caiam Que se caiam Ai nô nô que me dá la vergonha Ai que manda el rei que manda el regedor Ai que manda el rei Que manda el regedor Esses bailadores que bailem ao redor

3ª CENA: Memória da terra

Cantiga da Serra, Serra d’Arga, Madeira 

Cantas bem não cantas mal Cantas bem não cantas mal Gargantinha de marfim Eu dava um vintém às almas Eu dava um vintém às almas Se o meu cantar fosse assim D’onde vieste tu agora D’onde vieste tu agora Ferruge das si menia Não cantaste nem bailaste Não cantaste nem bailaste Vesti só p’ra tomar fria Eu agora vou cantar Eu agora vou cantar Já chegou a minha via Eu inda agora cantei Eu inda agora cantei Vou cantar mais uma via

Besbiana, dança do Douro

4ª CENA: Ad mortem festinamus

Encomendação das Almas, Minho

Acorda, corda pecador Emenda todo o pecado Que podes amanhecer No inferno sepultado Seja pel’o amor de Deus As almas do purgatório Se a vos não pede riqueza Pede-vos as migalhinhas Que sobram das vossas mesas Seja pel’o amor de Deus As almas do purgatório Umas choram outras cantam Rezai-lhe uma Avé Maria Pelo eterno descanso Seja pel’o amor de Deus 

Orai pelas pobres almas Detidas na expiação Vivas já vos foram caras Tende delas compaixão Dai senhor descanso eterno Aos remidos de Jesus Vosso coração clemente Chama-os à eterna luz  (2x) Nossos parentes e amigos Há pouco inda a gozar E agora no fogo eterno Como é triste o seu penar 


Ad mortem festinamus, virolai, dança da morte

Ad mortem festinamus Peccare desistamos Peccare desistamos  Scribere probosui De contemptu mundano Ut degentes seculi Non mulcetur in vano Iam est hora surgere A sompno mortis pravo A sompno mortis pravo  Ad mortem festinamus Peccare desistamos Peccare desistamos

5ª CENA: A festa

Marcadinho, dança da Beira Litoral

Vira do Salto, dança minhota

Rapazes quando eu morrer Levai-me de vagarinho (bis) À porta do meu amor Descansai um bocadinho (2x) Iò ai o larilólela Rua abaixo rua acima Toda a gente nos quer bem (bis) Só a mãe do meu amor Não sei que raiva me tem (2x) Iò ai o larilólela Quando passares por mim Deita os teus olhos ao chão (bis) Podemos nos querer bem E o mundo julgar que não (2x) Iò ai o larilólela Se rio dizem que rio Se choro dizem que choro Se me viro para ti Já dizem que te namoro (2x) Iò ai o larilólela 

Estrelas, S. Miguel, Açores

Este Paiva não se (a)poupa Nesta noite tão bonita Ao senhor João Garoupa Hoje vos venho fazer visita Vamos cantar às estrelas Todas a brilhar de dia A senhora das estrelas Seja sempre a nossa guia Não vos peço água nem cordo Mas agora vem ajudar Para no domingo gordo Nos servir para o jantar E ficamos obrigados No baile que nos quis dar E ficais vós convidado A vir connosco jantar

6ª CENA: A cidade do avesso

Tanchão, S. Miguel, Açores

Ai eu  tinha quatro amores Ai eu tinha quatro amores Dois de manhã dois de tarde Dois de manhã dois de tarde Agora tenho só um Agora tenho só um Vivo à minha vontade Vivo à minha vontade Esta moda do tanchão Esta moda do tanchão Quem houvera de amentar Quem houvera de amentar Sua pobre tecedeira Sua pobre tecedeira Entre os paus e sem tear Entre os paus e sem tear 

Vai de roda, moda de baile, S. Miguel, Açores

Vai de roda, vai de roda Vai de roda com primor Daqui desta região De quem há-de ser meu amori Hei-de cantar e bailar i Enquanto vida tiver E depois quando eu morrer Que cante e baile quem quiseri Os olhos do meu amori i São grãos de trigo na eira Semeados ao domingo E nados à segunda-feira 

7ª CENA: Teia

Dança dos homens, Lousa, Beira Baixa