Pressentimentos de momentos de felicidade inconsciente

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Kluge, Alexander (2007) Onze Histórias do Cinema in: ___ O Quinto Ato. p. 85 (excerto)[editar | editar código-fonte]

Mas o que ele contou (que para ele não era mais novidade) foi o seguinte: Maksim Górki tinha ido até Coney Island visitar as atrações: as rodas-gigantes, os galpões de entretenimento, os “milagres”, os locais de jogos de azar (construídos em vários andares), os tobogãs, os “espaços do nonsense e de esquecimento” e os olhos mágicos para ver as imagens em movimento. Ele considerou essa indústria de massas, o “princípio da distração”, uma “traição das verdadeiras necessidades do povo”, Ali, disse ele, as pessoas perderiam seu tempo e não ganhariam nada.

Mas daquelas instalações fantásticas de Coney Island, continuou Rem Koolhaas, não surgiriam apenas os arranha-céus de Nova York, mas também o cinema, ou seja, “novas condições reais”, ao passo que a crítica de Górki não havia levado à criação de nada real; a crítica, como previsto por Marx, tinha apenas acompanhado a realidade.

Para essa afirmação — continuou Koolhaas a desenvolver seu raciocínio — Górki não necessitaria da frase essencial, segundo a qual as massas têm sempre razão. Essa era uma frase com a qual ele teria concordado, mas que tiraria a seriedade da discussão. Tratar-se-ia muito mais da observação de que as massas “magnetizam atrações” de dois modos diferentes e assim podem fazer deslanchar ou destruir inovações criativas. Pois haveria uma aprovação maciça que por si nada produziria (mas que se deixaria instrumentalizar por terceiros, que procurariam dela se aproveitar. Ao mesmo tempo haveria uma segunda forma de aprovação, que seria espontânea e, além disso, duradoura. Dela poderiam tirar proveito empresários parasitas, que não conseguiriam, porém, modificar a direção desse desejo. Essa espécie de iniciativa de massas buscaria a “felicidade inconsciente”.

Nesse ponto surgiu uma pergunta do público (o orador falava em voz baixa, era difícil de entender e, portanto, era fácil interrompê-lo): o que significava “felicidade inconsciente”? Seria o antípoda da "infelicidade inconsciente”, respondeu Koolhaas. A “infelicidade inconsciente” terminaria sem memória (tal como na guerra, os soldados que avançam unicamente porque querem fugir da miséria das ordens de seus superiores arrojam-se inconsciente e inexoravelmente, mas se esquecem disso por completo após sua salvação). Ora, dizia Rem Koolhaas, nem as máquinas automáticas de Coney Island nem o “cinema desenvolvido” mais tarde teriam acumulado promessas suficientes de “felicidade inconsciente”, Momentos de surpresa, de um olhar súbito para outro mundo, de lembrança, provocados pelas fitas de cinema, teriam resultado, contudo num PRESSENTIMENTO, e este teria corrido de boca em boca. O pressentimento de que poderiam existir momentos de “felicidade inconsciente” seria suficiente para a criação de uma mídia.