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Sociologia e Comunicação USCS/Mercados Linguísticos e Poder Simbólico

Fonte: Wikiversidade
Economia das trocas linguísticas - Bourdieu - parte I
Aula 5 - Bourdieu - Economia das Trocas Linguísticas - parte II
Aula 5 pequeno complemento sobre lutas simbólicas

Temas da aula

Parte I

Rituais de fala/jogos de linguagem

Senso de oportunidade/Senso de aceitabilidade

Parte II

Mercados Linguísticos

Poder Simbólico

Enquadramento

Competência técnica e social

Em primeiro lugar, é preciso destacar que a nossa capacidade para falar depende de algumas competências específicas que desenvolvemos: uma Competência Técnica e uma Competência Social.

Nossa competência técnica aparece pela nossa própria condição humana: seres humanos podem falar, ou seja, tem em seu corpo os meios físicos (anatômicos e neurológicos) necessários para produzir a fala.

No caso da competência social - como o próprio nome diz - ela é adquirida socialmente, uma vez que, a fala precisa ser aprendida.

Falar não consiste apenas em emitir palavras organizadas em um certo código linguístico, mas também é preciso saber o que falar, com quem, quando e de que modo.

Se não falamos com qualquer um, de qualquer modo, sobre qualquer coisa, a qualquer momento, isso significa que a nossa fala pressupõe alguns rituais sociais ou jogos de linguagem. Esses jogos ou rituais dependem do desenvolvimento de certos tipos de sensibilidade.

Vamos chamar essa sensibilidade de senso de oportunidade e senso de aceitabilidade.

O Senso de Oportunidade (Kairós)

Diziam os sofistas que, no aprendizado da arte de falar bem, é preciso estar atento para a percepção do momento oportuno da fala (Kairós).

Pouco importa o que dissermos se não for dito de maneira oportuna, no momento certo. Essa competência está relacionada como o (re) conhecimento da situação e do momento da fala.

O Senso de Aceitabilidade

Também é importante lembrar que quando falamos, produzimos um produto muito especial que não está sujeito apenas a interpretação, mas, também, a avaliação.[ver:meme]

Muitas vezes, a condição necessária para que o discurso seja aceito não está no entendimento que temos dele, mas do valor que damos a quem o pronuncia (ver: meme).

Portanto, qualquer discurso produz signos a serem interpretados, certamente. Mas, ao mesmo tempo, eles apresentam-se como signos de riqueza (esses discursos são valorizados ou desvalorizados) e signos de autoridade (eles tem o poder de realizar coisas no mundo)

O Mercado Linguístico

Vamos analisar, agora, o conceito de mercado linguístico:

Carregamos conosco esse conjunto de disposições – uma espécie de “memória” – das nossas experiências com a fala em determinadas situações (falando com os pais, amigos, vendedores, professores, clérigos).

Esse conjunto de disposições é o que chamamos de nosso habitus linguístico – um certo modo de falar. Ele faz com que tenhamos condições de antecipar algumas reações das pessoas a quem nos dirigimos e que sejamos capazes de reconhecer determinadas situações sociais.

Essas situações que aprendemos a reconhecer são os chamados mercados linguísticos, uma vez que, neles, a nossa fala pode ser valorizada ou não, pode sofrer concorrência, pode ser monopolizada etc.

“[Uma ciência do discurso](...) deve levar em conta as leis de formação de preços características do mercado em questão (...) as condições de recepção antecipadas fazem parte das condições de produção, e a antecipação das sanções do mercado contribui para determinar a produção do discurso. (...) Tal sentido (...), acaba determinando as correções e todas as formas de autocensura, concessões que se outorgam a um universo social pelo fato de aceitar tornar-se aí aceitável.” (Pierre Bourdieu. Economia das Trocas Linguísticas)

Quando produzimos um discurso, desenvolvemos também uma antecipação das condições em que aquele discurso será recebido. Essa antecipação, quando negativa, pode levar-nos a um conjunto de medidas de autocensura (ver: meme).

Por outro lado, algumas pessoas acabam agindo como porta-vozes da opinião de uma série de ouras pessoas em um mercado linguístico.

Eles ou elas são capazes de falar como representantes de um grupo, colocam-se como um grupo falando e, assim, fazem com que determinados interesses e motivações ganham um lugar em meio às palavras e transforme-se em discurso que merece ser ouvido.

Será que isso que ocorre no chamado Mansplaining ou Manterrupting? Será que o movimento feminista, por exemplo, precisa enfrentar este tipo de questão?

No caso dos povos colonizados, existe sempre a questão levantada por Gayatri Spivak: Pode o subalterno falar?

O Poder Simbólico

O poder simbólico é um poder (econômico, político, cultural ou outro) que consegue ser alvo de reconhecimento, por isso, é preciso entender que se trata de um tipo de poder que não é físico (embora possa ter consequências reais). Ele é exercido no plano do sentido, na sua capacidade de gerar conhecimento e reconhecimento.

Ele está relacionado com a questão do enquadramento (framing).

O enquadramento é um dispositivo interpretativo, um padrão de organização do discurso, que estabelece alguns princípios de seleção de certas palavras e ângulos de abordagem na construção das notícias. São padrões de apresentação, cognição e interpretação; de seleção, ênfase e exclusão que organizam a narrativa escrita e audiovisual. A combinação de determinadas ações em determinados contextos são capazes de produzir certos enquadramento ou quadros de referência para os indivíduos como observa Erving Goffman, que desenvolve amplamente o termo.

As palavras exercem, assim, um poder tipicamente mágico: fazem ver, fazem crer, fazem agir.

Mas essa magia, como toda outra, não pode ser explicada apenas por esse poder do produtor do discurso. É preciso ir além e reconhecer as condições sociais que possibilitam essa eficácia mágica das palavras.

Quem fala? Quem está autorizado a falar? De que lugar falamos?

Para completar, é preciso observar que esse poder das palavras só pode ser exercido sobre aqueles que estão dispostos a ouvi-las, a crer nelas.

Vamos observar o que dizem as duas citações abaixo:

“…os agentes sociais e os próprios dominados estão unidos ao mundo social (até mesmo ao mais repugnante e revoltante) por uma relação de cumplicidade padecida que faz com que certos aspectos deste mundo estejam sempre além ou aquém do questionamento crítico” (Pierre Bourdieu em O que falar quer dizer)

Vale a pena pensar em uma observação de outro intelectual francês:

“O que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa como uma força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso. Deve-se considerá-lo como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais do que uma instância negativa que tem por função reprimir”. (Michel Foucault em Microfísica do poder)

ATIVIDADE
Referências

COLLING, Leandro. Agenda-setting e framing: reafirmando os efeitos limitados.Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 14 • abril 2001

GIRARDI Jr, Liráucio. Pierre Bourdieu: Mercados Linguísticos e Poder Simbólico. Famecos, Porto Alegre, v. 24, n. 3, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2017

KARHAWI, Issaaf . Influenciadores digitais: conceitos e práticas em discussão. Revista Communicare. Volume 17 – Edição especial de 70 anos da Faculdade Cásper Líbero

LEMOS, André. A nova esfera conversacional. in Dimas A. Künsch, D.A, da Silveira, S.A., et al, Esfera pública, redes e jornalismo., Rio de Janeiro, Ed. E-Papers, 2009, pp. 9 – 30.

LINS, Daniel (org). Pierre Bourdieu: o campo econômico. Campinas (SP), Editora: Papirus, 200 (O que é falar? e Fetichismo Político)


O dia em que relatos do primeiro assédio tomaram conta do Twitter – El País – MARINA ROSSI – 23/10/2015

TV peruana agora tem um noticiário em quéchua. Por que isso é um gesto político e social -Rafael Iandoli – Nexo 17 Dez 2016

Exército de fact-checking combate notícias falsas – Bianca Fortis, MediaShift | 06/11/17

Claire Wardle: combater a desinformação é como varrer as ruas – Observatório da Imprensa – Por Angela Pimenta em 14/11/2017 na edição 966

Critical Desinformation Studies - Citap

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