Wikinativa/Giovanna Zambrini (vivencia Guarani 2018 - relato de experiência)

Fonte: Wikiversidade

O presente relato não será construído baseado em uma linha temporal dos acontecimentos, pois já inicio contando que perdi a noção de tempo nesses quatro dias de vivência na Aldeia Guarani Rio Silveiras. A vivência começou muito antes da viagem, já em sala tivemos a chance discutir e desconstruir muitos dos preconceitos enraizados em nossa cultura a respeito do que se esperar e como se portar em uma imersão em uma cultura resiliente como a guarani. Apesar da constante tentativas de colonização e imposição de cultural (mesmo nos dias de hoje, como pudemos observar em diversos momentos da vivência) sobre a cultura indígena, ficou evidente a perseverança e resistência de um povo que é permissivo a trocas e incorporação de muitos costumes ocidentais, mas que ainda sim carrega consigo um modo de vida completamente diferente do nosso mesmo após todos esses anos de luta. Quando desembarcamos do ônibus em meio a chuva já pudemos sentir, assim de prontidão, o gosto que teriam os próximos dias. Não só pela lama e pela chuva (presentes em toda a viagem), mas também pelo espírito de coletividade e pelo acolhimento no qual fomos recebidos. Uma preocupação inicial minha era não saber dosar o quanto eu poderia viver a cultura indígena sem me apropriar dela, digo isto pois tive um receio inicial de participar ativamente da reza na vivência na aldeia do Jaraguá, participar de rituais como a dança, o canto, o fumo, o uso de acessório e instrumentos e até mesmo a hora de falar. Esse receio logo foi acalmado com na primeira reza com o convite a todos para participar e dançar com eles. Creio que a pacificidade do povo guarani permite que você conheça e viva a cultura. O que me trouxe de volta novamente ao sentimento de acolhimento da chegada. Me senti acolhida pela cultura guarani em todo momento. Nesses dias pude refletir muito sobre a nossa relação com o meio ambiente. Foram em momentos como os de trilhas e de tomarmos banho no rio e na cachoeira, que entendemos que fazemos parte da natureza e que nossa cultura nos faz sentirmos a parte. Fazer uma trilha e nadar no rio não deveria ser uma atividade de lazer de fim de semana, a natureza deveria fazer parte do seu ambiente, do seu “quintal”. A fala do cacique sobre a terra em que ele habitam atualmente, e sobre todos os recursos que a natureza fornece e que hoje são escassos e de difícil acesso nos prova o quanto nos distanciamos do ambiente natural e de tudo que ele nos fornece. Os momentos de lazer com as crianças foram os mais gostosos, em minha opinião; a risada e o contato fácil, a distração com brinquedos e brincadeiras simples realça todas as travas e preocupação da cultura ocidental que incorporamos para coisas simples e banais, como por exemplo nos sujar na lama. A simplicidade da vida na aldeia (muitas vezes confundida com carência) ficou evidente a todo o momento, sendo andando descalço na lama ou sendo comendo tipá feito na hora. Uma situação vivida por nós na aldeia foi o sumiço das camisetas separadas para darmos a atividade proposta por nosso grupo: Oficina de Customização de Camisetas, onde estas se misturaram com as roupas que seriam doadas aos índios. Apesar do desespero inicial dessa confusão, este foi um exemplo da relação da aldeia com os bens materiais e bens privados, que contrapõem a nossa, e que chega a ser difícil de compreender no primeiro momento (levando em consideração ao comportamento capitalista que aprendemos a desenvolver). Por fim, concluo relatando a mobilização e a conscientização do povo guarani na luta em prol dos direitos dos povos originários, principalmente frente ao atual cenário político. Foram muitos os momentos de discussão e de troca sobre política e luta de um povo que resiste há anos contra aos massantes ataques a sua cultura. O povo indígena tem uma consciência coletiva admirável e inspiradora.