Wikinativa/Marcos Rossi (vivencia Guarani 2022 - SMD - relato de experiência)

Fonte: Wikiversidade

Introdução

Durante um semestre nos planejamos para realizar a viagem de imersão na Aldeia Rio da Silveira, localizada no município de Bertioga, com o objetivo de conhecer, aprender, viver a cultura indigina e documentar nossas impressões subjetivas, através do método da observação participante sobre essa vivência que teve duração de 3 noites e 2 dias. Para isso, nos preparamos durante 4 meses através de aulas, palestras e textos disponibilizados na disciplina “Seminários de Políticas Públicas Setoriais II” que teve como finalidade nos ensinar sobre os costumes dos vários povos indígenas, suas lutas políticas e tradições.

Vivência

Na Sexta-feira 04/11/2022, dia da nossa ida para Aldeia, fui acometido de fortes dores de cabeça e na barriga poucas horas antes de sairmos em partida para a viagem, essa situação me deixou muito triste, pois vivi a expectativa durante vários meses dessa jornada para no final, não saber se teria condições de ir. Bom, se escrevo esse relato, você já sabe, fui. Mesmo com dores, resolvi ir, pois o desejo e curiosidade de viver esse evento eram maiores que os desconfortos que eu sentia. Durante a tarde, saímos da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo(EACH-USP) em direção a Aldeia Rio de Silveiras, o percurso durou quatro horas e meia e foi bem divertido, cheio de descontração entre os alunos, monitores e professores.

Chegamos já era noite, o local onde montamos nossas barracas não tinha tanta iluminação artificial o que dificultou a montagem das nossas casas provisórias, mas nos agraciou com a vista bem nítida da luz e das estrelas. Após nos assentamos no local, fomos convidados a ir até a casa de reza, onde são realizadas as atividades religiosas dos Tupis-Guaranis. Ao entrar, fomos orientados para que homens e mulheres sentaram separados e esperamos por alguns minutos a Filha do Pajé, Lucimara nos receber. Ela se apresentou e realizou com os alunos uma roda de conversa debatendo questões políticas, de educação do local e nos explicou algumas tradições do seu povo.

Ao fim da fala de Lucimara, fomos jantar e nos preparamos para  dormir, no outro dia pela manhã, tomamos café e notamos que o local onde estávamos estava rodeado de crianças que vieram ao nosso encontro pedindo para que brincassem com elas. Durante toda manhã, até o horário de partida para a trilha da cachoeira, ficamos nos divertindo com eles, diferentemente dos adultos que ficaram bem mais distantes às crianças logo de pronto vieram nos receber calorosamente.  

Pelo começo da tarde do 2 dia, fomos até a cachoeira, fomos acompanhados por dois guias, que pouco falaram com a gente, apesar de vez ou outra algum estudante puxar uma tentativa de conversa. Ao longo da caminhada até a cachoeira duas coisas me surpreenderam, a primeira beleza e a preservação do local e a segunda a quantidade de casas de alvenarias abandonadas no caminho. Apesar do professor Jorge Machado ter relatado em aula que o Governo do Estado havia construídos essas casas e que os tupi-guaranis não estava utilizando, pois aquele tipo de moradia não fazia sentido cultural para eles, me surpreendeu ver in loco aquilo, pois foi a materialização de políticas públicas que não se ouve a população alvo. Na chegada a cachoeira foi muito divertido, nadamos, brincamos e passamos muito frio na água gelada do local.

Voltamos já era fim de tarde, almoçamos e logo após voltamos a brincar com as crianças e como criança durante horas, foi muito divertido para todos esse momento, por algumas horas meu menino interior se projetou novamente. Chegando a noite jantamos e, logo após fomos até a casa reza, e a Pajé Lourdes fez algumas falas sobre o preconceito que os povos indígenas sofrem ainda hoje, o que faz com que alguns indígenas sintam vergonha de expressar sua cultura e como isso é cruel ao seu povo.

Após sua fala se iniciou um canto religioso, onde fomos convidados a participar. Uma coisa que se fez notar e que comentamos entre nós estudantes é que notamos a pouca quantidade de indígenas na casa de reza durante esses 2 dias, não entendemos se o público é baixo geralmente ou se existia alguma relação de nós jurás(não indígenas) estarmos lá. No início do terceiro, acordamos, tomamos café e começamos a nos preparar para deixar a aldeia, foi muito difícil a partida, principalmente a despedida das crianças, do local e da dinâmica da vida sem um relógio te controlando. Ao fim da tarde, entramos no ônibus e partimos de volta a EACH.

Conclusão

O povo tupi- Guarani é bem reservado, principalmente os adultos, foram pouco os contatos e os diálogos que pudemos ter com eles, acredito que isso não se resume “só” a serem mais introvertidos, mas também ao fato de historicamente, nós jurás sermos o principal inimigo do seu povo. Todavia, as crianças fogem a essa regra de de introversão ou desconfiança, as crianças tupi-guarani são extremamente afetuosas e abertas a conversas e brincadeiras. No que se refere aos atravessamentos que tive na viagem pontuo principalmente dois, que foram a paciência para esperar, respeitar o tempo do outro é essencial para a vida em coletividade e o segundo foi a necessidade de sermos mais crianças em nossas vidas para não nos levarmos tão a sério, não nos cobrar a todo momento e o mais importante se divertir, a vida precisa do lúdico da brincadeira e da leveza.

A vida atravessa tudo, atravessa uma pedra, a camada de ozônio, geleiras.

A vida vai dos oceanos para a terra firme, atravessa de norte a sul, como uma brisa, em todas as direções.

A vida é esse atravessamento do organismo vivo planeta numa dimensão imaterial

.Ailton Krenak