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Wikinativa/Mariana Araújo Barbosa dos Santos (vivência Guarani 2019 - relato de experiência)

Fonte: Wikiversidade

Estou no oitavo semestre da graduação em Direito e, nesse semestre, buscando ampliar meus horizontes, procurei cursar optativas que, de alguma forma, me trouxessem conhecimento relacionado ao Direito, mas muito além dele. Nesse contexto, surgiu o interesse em me matricular na disciplina “Seminários de Políticas Públicas Setoriais III”. Em um primeiro momento, o interesse surgiu em razão do próprio nome. Posteriormente, o interesse foi confirmado por causa dos objetivos e programa da disciplina, bem como por causa do docente responsável. Trata-se de disciplina oferecida como optativa livre no segundo semestre do ano letivo, coordenada pelo Professor Doutor Jorge Machado, o qual possui vínculo com o curso de Gestão de Políticas Públicas e com o Ciclo Básico da Escola de Artes, Ciência e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Após acompanhar as aulas e vivenciar duas experiências em dois diferentes territórios indígenas (Jaraguá e Rio Silveiras), posso dizer que tive a oportunidade de ter contato com importantes questões relacionadas aos povos Originários e Tradicionais do Brasil, bem como suas pautas e lutas. Além disso, tratou-se de imersão na cultura e história dos povos originários, propiciando uma reflexão crítica acerca da temática.

Vivência: Aldeia no Jaraguá

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O nosso grupo foi muito bem recepcionado pela comunidade local, a qual pudemos conhecer através de uma caminhada de aproximadamente 30 minutos pelos quatro núcleos formadores da Aldeia, ínterim no qual pude visualizar os desafios enfrentados pela comunidade e refletir sobre eles. Posso citar dois que muito me impressionaram: o tamanho da reserva e a influência urbana, sendo que os dois se relacionam, de certa forma.

A reserva indígena conta com apenas 1,2 hectares, fazendo com que a população local não consiga desenvolver totalmente seu modo de vida, o qual pressupõe o cultivo de alimentos e a pesca. Dessa forma, acabam recebendo muitas influências urbanas, especialmente no tocante à (má) alimentação urbana, com gordura e açúcar. Além disso, pude verificar outros desafios enfrentados, como por exemplo a falta de saneamento básico e a dificuldade de acesso às políticas públicas.

Contudo, mesmo com todas as adversidades, é muito forte o empenho dos povos originários em valorizar e proteger suas culturas e valores. É o que eu vi e senti tanto na conversa com a liderança Sônia, quanto na Reza, ambos em uma das Casas de Reza da Aldeia.

A experiência vivenciada na Aldeia Indígena do Jaraguá foi extremamente marcante na minha vida, pessoal e profissionalmente falando. Através da vivência, pude conhecer um modo de vida diferente do meu, com valores diferentes, bem como reconhecer que ali foi o meu ponto de partida, bem como de toda a sociedade brasileira, assim, percebi que esses valores, como o da coletividade e do respeito à natureza, devem ser resgatados urgentemente. Além disso, pude refletir como o estilo urbano está interferindo e acarretando consequências para os povos indígenas, pelo que se faz necessário o debate acerca da temática.

Vivência: Aldeia Rio Silveiras

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Fomos muito bem recepcionados pela comunidade local, o que me fez sentir bem desde o primeiro momento. Devo confessar que a expectativa para essa vivência estava alta, ainda mais depois de ter tido contato com o território indígena do Jaraguá anteriormente, conforme falado acima.

Em um primeiro momento, já no território indígena Rio Silveiras, senti aquele lugar e tentei me desconectar do meu estilo de vida urbano, tentando me conectar com a natureza e um estilo de vida ditado por ela. Depois, realizando as atividades propostas pelo meu grupo - Arte e Música - e pelos demais grupos, fui tendo cada vez mais contato, principalmente com as crianças, o contato foi acontecendo de forma orgânica e genuína. Ver as crianças livres, com pés descalços, em contato com a terra, caindo no chão e levantando, correndo para a cachoeira, nadando no rio, tão livres, foi algo que me fez questionar como tratamos nossas crianças, como criamos nossas crianças e o impacto que isso tem no futuro de cada vida.

Além disso, o contato com as lideranças foi simplesmente incrível. Ver o tanto de conhecimento acumulado nessas pessoas e o esforço que cada um faz para transmitir esse conhecimento, pois sabem da importância que isso tem para a preservação da cultura indígena. O Pajé, o Marian, o Cacique foram figuras essenciais para essa vivência ter sido tão enriquecedora do jeito que foi.

Por fim, preciso falar do momento da Reza, que foi muito especial para mim. Eu tenho problemas respiratórios e dentro da Casa de Reza continha muita fumaça no momento da Reza, o que dificultava minha respiração, mesmo assim eu não conseguia sair daquele lugar, daquele momento. Estava completamente envolvida com o momento sagrado e especial, uma oportunidade única de me purificar e me energizar conforme a cultura dos povos originários.

Também senti essa purificação e energização por meio do próprio contato com a natureza, quando plantamos uma muda na Mata Atlântica, na trilha e na cachoeira.

Bom, o meu objetivo, no início do semestre, era ampliar os meus horizontes, buscando ir além do conhecimento que poderia adquirir na Faculdade de Direito. Chegando ao fim do semestre, posso dizer que sinto que alcancei meu objetivo e nessas vivências aprendi muito e abri minha mente para novas perspectivas e questionamentos, pelo que estou muito feliz e satisfeita, além de estar disposta a ter um compromisso de sempre buscar o diálogo com o desconhecido para mim, com o novo.