Wikinativa/Rita de Cassia Barbosa Farias (vivencia Guarani 2018 - relato de experiência)

Fonte: Wikiversidade

Nome: Rita de Cassia Barbosa Farias

Nº USP: 9274701

Vivência Indígena Núcleo “Ivy Porã” - Jaraguá e Aldeia Rio Silveiras - Bertioga[editar | editar código-fonte]

Sendo uma aluna veterana de políticas públicas na EACH, estava prestes a me formar quando por acaso soube da existência da matéria, e apesar de trabalhar no horário proposto para a disciplina, me dispus a articular uma maneira de encaixá-la na minha grade. Antes de iniciar a disciplina, estive em 3 vivências no núcleo “Ivy Porã”, para a construção da casa de reza (que foi finalizada justamente na vivência proposta pela disciplina) e outra em Rio Silveiras - Bertioga, no Encontro dos Povos Indígenas. Já tinha então alguma ideia mais ou menos concreta sobre como seriam as experiências pela disciplina, compreendendo que ainda sim diferenças intrínsecas ao status “aula” e o fato de cada experiência ser única, constituíam a essência do que me aproximou da matéria em primeiro lugar: instigar os alunos a saírem dos muros da escola e conhecer a realidade de comunidades que sofrem diretamente com as políticas públicas injustas e insipientes do Brasil.

Tendo em vista como setores vulneráveis da população estão mais suscetíveis aos reveses conservadores que desmobilizam políticas públicas progressistas, como os que vivemos no momento atual, considero a importância de fazer uso dos recursos que a USP possibilita para investir na aproximação com essas comunidades, conseguindo construir juntos, de baixo para cima, possibilidades, concretizar projetos, compartilhar momentos de realização conjunto. Isto é o tipo de coisa que me inspira e motiva, e agradeço a oportunidade de ter feito a disciplina.

Na vivência no Jaraguá, carreguei a sensação de compartilhar uma realização sagrada junto de muitas pessoas queridas, que conheci ao longo das vivências anteriores. A formação de vínculos e o respeito à conexão com os membros das comunidades é uma base necessária para todo projeto que vise com respeito construir coisas efetivas e que possam ser integradas à comunidade, e em diversos momentos não só observei, como participei destas construções de vínculos com Irene, Carlos, Thiago e Izac. O dia da visita da faculdade foi de extrema alegria, cheio de barro, mão na massa e pés na terra. A reza foi a mais intensa em que já participei, enxergando a beleza daquela concretização, dado o contexto sócio-político da luta indígena e do Brasil neste momento, acredito que a resistência mais forte e corajosa é aquela que visa à moradia, pois é no habitar que os vínculos se formam, é no viver e construir junto que se firma a força necessária para a luta. E na casa de reza, senti toda a potência que ali se unia em energia pelo espaço.

A vivência em Bertioga teve muitos imprevistos e dificuldades, a chuva e o período eleitoral trouxeram algumas angústias, nada que impedisse a potência daquela terra sagrada de incorporar nossa viagem. Ademais dos imprevistos e de algumas dificuldades, que são normais em qualquer projeto que envolve tantas pessoas - como dissonância no fluxo de comunicação e logística da alimentação, as experiências foram ricas do começo ao fim. Ter a oportunidade de conversar e ouvir o cacique, bem como aprender a tocar tambor (mesmo com o braço machucado) com pequeninos indígenas, vou carregar no coração.

Minha única ressalva para com a forma como observei as dinâmicas de inserção dos alunos na aldeia é com relação à troca de informações sobre alimentação. É muito importante que qualquer proposta de mudança de algum costume - mesmo que não seja um costume nativo, tendo em vista que durante séculos de dominação, muitos hábitos foram inseridos e incorporados na cultura indígena de uma forma danosa - seja muito bem abordada com as pessoas, pois somente quando um indivíduo compreende e significa a importância de alguma informação em sua própria cultura, é que isso realmente é incorporado. Desta forma é delicado quando apenas propomos algumas mudanças sem azeitar os fluxos de troca e comunicação. Mesmo que nossas comidas fossem apenas compartilhadas entre nós mesmos, toda as formas da nossa estadia impactam nos que ali conviveram conosco, diretamente no caso das indígenas que foram contratadas.